O Calvinismo não é apenas uma
sistematização teológica a partir de preceitos das Escrituras Sagradas. Ele é,
antes, um Sistema, uma Cosmovisão de Mundo, capaz de refletir sobre as mais
graves e profundas inquietações do homem, oferecendo-lhes respostas. Tendo a
bíblia como a fonte fundamentadora de sua Cosmovisão, seu olhar sobre o homem,
sobre Deus e sobre o mundo tem contribuído para promover grandes avanços na
área social, na área econômica, na área política e em muitas outras áreas.
O Calvinismo realmente
nos prevê uma unidade de sistema de vida [...]. Devemos perguntar quais são as
condições requeridas para sistemas gerais de vida, tais como o Paganismo, o
Islamismo, o Romanismo e o Modernismo, e então mostrar que o Calvinismo
realmente preenche essas condições [...]. Portanto, como fenômeno central no
desenvolvimento da humanidade, o Calvinismo não está apenas habilitado a uma
posição de honra ao lado das formas paganista, islâmica e romanista, visto que
como estes ele representa um princípio peculiar dominando o todo da vida, mas
também satisfaz cada condição requerida para o avanço do desenvolvimento humano
a um estágio superior. E isto permaneceria ainda uma simples possibilidade sem
qualquer realidade correspondente, se a história não testificasse que o
Calvinismo tem realmente induzido o rio da vida humana a fluir em outro canal e
tem enobrecido a vida social das nações (KUYPER, 2002. p.28,47).
Lembo, escrevendo
sobre isto ainda observa:
O
Calvinismo não é somente um sistema teológico completo [....], mas também é uma
completa biocosmovisão que determina para o calvinista o ponto de partida para
toda a sua reflexão e sua vida prática; que determina enfim diretrizes pressuposicionais
de qualquer área da vida e do pensamento (LEMBO, 2000. p.120).
Além disso, o calvinismo é capaz de
promover, naqueles que abraçam essa Cosmovisão de mundo, um rigoroso sentido de
busca pela Ética, pela Moral e pelas virtudes. Basta um olhar, ainda que não
muito atento, para os países que, de alguma forma, foram influenciados pelo
Calvinismo e logo ficará evidente que são países com um grau de justiça social
e de desenvolvimento extremamente relevantes, como bem observa Weber:
Um simples olhar às
estatísticas ocupacionais de qualquer país de composição mista mostrará, com
notável frequência, uma situação que muitas vezes provocou discussões na
imprensa e literatura católicas.O fato de que os homens de negócios e donos do
capital, assim como os trabalhadores mais especializados e o pessoal mais
habilitado técnica e comercialmente das modernas empresas é predominantemente
protestante (WEBER, 2002. p.37)
Em tempos de colapsos, de relativismo
das virtudes, da falta de Ética e da moral questionável, o Calvinismo tem
surgido como sendo um antídoto interessante, já testado historicamente.
Esse ambiente favorável à Ética e à moral
não é promovido apenas pelos chamados “calvinistas”. O próprio Calvino, no
século XVI, pondo em prática a Cosmovisão de Mundo que tinha, influenciou
grandemente, positivamente, e até com certa radicalidade moral, segundo alguns
historiadores, a política, a economia e muitas outras áreas[1].
Calvino é um dos
teólogos clássicos que mais escreveram sobre o governo civil e em suas ideias
firma-se a tradição reformada sobre política. Sua atuação na cidade de Genebra
não foi somente teológica e eclesiástica, mas [...] teve intensa atuação na
estruturação da sociedade civil daquela cidade, participando igualmente da
administração e dos detalhes operacionais do seu dia-a-dia (PORTELA, 1996,
p.98).
Calvino, além de ter tido uma grande
atuação na esfera Política e na Administração Civil, áreas das mais afetadas pela
frouxidão Moral e Ética, também deu grande contribuição escrevendo sobre o tema.
Em seu mais famoso trabalho “As Institutas da religião Cristã[2]”, no Livro Quatro, capítulo 20, que tem por
título “Do Governo Civil”, Calvino
dedica 32 seções sobre o assunto.
Escrevendo sobre os governantes,
Calvino deixa claro que é inconcebível que vivam de forma corrupta. Ele
entendia a atuação do governo civil quase que como um ministério divino,
conforme observa Portela, citando-o, no livro 4 capítulo 20:
Se eles cometem qualquer
pecado isso não é apenas um mal realizado contra pessoas que estão sendo
perversamente atormentadas por eles, mas representa, igualmente, um insulto
contra o próprio Deus de quem profanam o sagrado tribunal. Por outro lado,
possuem uma admirável fonte de conforto quando eles refletem que não estão
meramente envolvidos em ocupações profanas [...], mas ocupam um ofício por
demais sagrado, até porque são embaixadores de Deus (PORTELA, 2009, p.99).
E ainda, em seu tempo,
Genebra foi o primeiro
lugar na Europa a ter leis especiais que proibiam [...]; sendo comerciante,
cobrar além do preço permitido ou roubar no peso e também (e isso se estendia
aos produtores) estocar mercadorias para fazê-las faltar no mercado e assim
majorar o preço (NICODEMUS, 1998, p.131).
Calvino parece ter entendido como
ninguém que:
A compreensão do
cristianismo como um sistema total de vida é fundamental para nosso engajamento
nas questões de desenvolvimento, busca de equidade e justiça social em nosso
tempo (LEITE, 2006. pg.57).
Biéler deixa isso
muito claro ao citar as palavras de Calvino:
Os
pobres aí estão como testemunhas do ministério de Jesus Cristo, destinados a
serem reconhecidos como tais pelas pessoas de fé [...] e os ricos são ricos
senão para exercer o ministério do rico, segundo Deus, que consiste em
reconhecer que a parte suplementar que recebeu é precisamente destinada aos
pobres (BIÉLER, 1990. p.643).
E ainda:
O homem
é apenas o fiduciário dos bens que lhes foram entregues pela graça de Deus. Ele
deve, como o servo da parábola, prestar contas até o último centavo do que lhe
foi confiado, e seria no mínimo perigoso gastar qualquer deles apenas para seu
prazer, em detrimento da glória de Deus. (BIÉLER, 1990. p.127).
[1]
Embora não tenha ocupado nenhum cargo governamental, Calvino exerceu
enorme influência sobre a comunidade, não somente no aspecto moral e
eclesiástico, mas em outras áreas. Ele ajudou a tornar mais humanas as leis da
cidade, contribuiu para a criação de um sistema educacional acessível a todos e
incentivou a formação de importantes entidades assistenciais como um hospital
para carentes e um fundo de assistência aos estrangeiros pobres. Conforme: http://www.mackenzie.br/7034.html, acessado em 31/08/2016.
[2]
As Institutas: Calvino
produziu ao todo oito edições do texto latino (1536-1559) e cinco traduções
para o francês. A 1ª edição tinha apenas seis capítulos; a última totalizou
oitenta. Equivale em tamanho ao Antigo Testamento mais os Evangelhos sinóticos
e segue o padrão geral do Credo dos Apóstolos. Visava ser um guia para o estudo
das Escrituras.Livro I: O Conhecimento de Deus, o Criador: o duplo
conhecimento de Deus, as Escrituras, a Trindade, a criação e a
providência.Livro II: O Conhecimento de Deus, o Redentor: a queda e a
corrupção humana, a Lei, o Antigo e o Novo Testamento, Cristo o Mediador – sua
pessoa (profeta, sacerdote, rei) e sua obra (expiação).Livro III: A
Maneira Como Recebemos a Graça de Cristo, Seus Benefícios Efeitos: fé e regeneração,
arrependimento, vida cristã, justificação, predestinação, ressurreição
final.Livro IV: Os Meios Externos Pelos Quais Deus nos Convida Para a Sociedade
de Cristo: a igreja, os sacramentos, o governo civil. Conforme: http://www.mackenzie.br/15914.html,
acessado em 02/09/2016.
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