Sempre soubemos que aqueles que fossem salvos morariam, final e definitivamente, no CÉU. Claro que a posição dos Testemunhas de Jeová também era bem conhecida. Segundo eles, a TERRA seria o HABITAT FINAL DOS JUSTOS.
Contudo, ultimamente está sendo difundida por teólogos reformados, cada vez mais, a ideia de que realmente a TERRA será a MORADA FINAL DOS JUSTOS.
Como porta-voz desse "pensamento supostamente reformado", compartilhado por muitos outros que professam a boa teologia reformada, utilizaremos a fala de um dos mais proeminentes teólogos brasileiros - o Drº Heber Campos, que tem trabalhado esse e outros assuntos, conseguindo chamar atenção para si, com algumas declarações polêmicas. Vejamos:
Em um encontro da FIEL, onde foi um dos conferencistas, lhe fizeram a seguinte pergunta: "Pastor Heber, a gente vai morar no céu?". Transcreveremos abaixo, literalmente, sua resposta:
"Eu creio que sim! Aliás, eu tenho certeza que sim".
Contudo, se observarmos bem a continuidade de sua resposta, veremos que ele NÃO acredita que o CÉU será a MORADA FINAL DOS JUSTOS, mas apenas uma espécie bem peculiar de MORADA PROVISÓRIA. Observe:
"ATÉ que a redenção nossa se complete, no dia da ressurreição ou no dia da transformação daqueles que tiverem vivos; se você morrer antes, você vai direto pro CÉU, porque o CÉU é o lugar pra onde vão os remidos do Senhor ATÉ que sua redenção se complete. Então, nós vamos morar no CÉU, só que: o CÉU NÃO É O LUGAR DEFINITIVO de morada nossa; o CÉU é um local temporário".
E continua:
"[...] na volta do Senhor, então, nós viremos pra cá, encontramos com Jesus, ele nos leva pra cima, transforma tudo que está AQUI EM BAIXO e nos trás de VOLTA PRA CÁ". A NOVA TERRA é o DESTINO FINAL DO HOMEM; a NOVA TERRA é o habitat DEFINITIVO do homem"
Se observarmos bem as expressões "AQUI EM BAIXO" e VOLTA PRA CÁ", parece ficar claro que a expressão "Novo Céu e Nova Terra", não se trata de uma espécie de "outra dimensão" ou mesmo um tipo de "sinônimo do CÉU", como convencionalmente costumávamos pensar. Antes, pelo contrário, na mente do Drº Heber, e de muitos com ele, a referência é, de fato, a esta mesma TERRA em que agora habitamos. Ela apenas sofrerá uma transformação "em tudo que está aqui embaixo", no dizer dele. Essa ideia parece advogar consenso entre os reformados, mas está longe de ser aceita pacificamente e sem dificuldades, o que fica evidente quando o Drº Heber reconhece: "isso pode chocar você, pode provocar você". Confira no vídeo abaixo:
Dizem que as Confissões e os Catecismos Reformados silenciam em relação ao tema "MORADA FINAL DOS JUSTOS" e que, por isso mesmo, há certa liberdade para pensar o assunto e até arriscar algumas divagações teológicas. Ou seja, esse pensamento do Drº Heber, por exemplo, não trás, segundo se pensa, nenhum problema ou choque confessional, já que a Confissão de Fé de Westminster, que ele subscreve, não trata do assunto, deixando-o livre daquilo que seria a interpretação oficial de sua igreja. Mas, será que isso é verdade?
O que têm a nos dizer sobre a MORADA FINAL DOS JUSTOS as Confissões e Catecismos Reformados? Absolutamente nada, como afirma a maioria? É o que veremos a seguir. Faremos um breve levantamento desse tema a partir desses textos confessionais. Vejamos:
1º) CONFISSÃO BELGA:
Fala de "Recompensa gratuita" para anunciar o Estado Final dos justos, que vão "possuir a glória que jamais o coração de um homem poderia conceber" (Artigo 37:). Os textos utilizados para basear tal afirmação nos remetem ao CÉU e não à TERRA, ainda que restaurada, como por exemplo:
"Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós" (Mateus 5:12).
2º) CATECISMO DE HEIDELBERG:
Coloca o JUSTO, em seu estado final, no CÉU e não na TERRA com o argumento de completude do Corpo de Cristo, uma vez que "Ele é, no CÉU, nosso advogado junto a seu Pai. Em Cristo, temos nossa carne no CÉU como garantia de que ele, como nosso cabeça, também nos levará para si como seus membros" (Pergunta 49). Nos levará para o CÉU ou para TERRA? Obviamente que para o CÉU.
E ainda:
Depois da afirmação de que "Cristo está assentado à direita de Deus" (Pergunta 49), afirma também, como se o salvo estivera falando que "me levará para si mesmo, com todos os eleitos, na alegria e glória CELESTIAIS" (Pergunta 52).
Diz também que "Meu consolo é que, depois desta vida, minha alma será imediatamente ELEVADA para Cristo, seu cabeça. E que também meu corpo ressuscitado pelo poder de Cristo, será UNIDO novamente à minha alma e se tornará semelhante ao corpo glorioso de Cristo" (Pergunta 57).
Note que não estamos tratando aqui de um suposto "estado intermediário" (como é ortodoxamente pensada essa doutrina), quando a alma estaria aguardando a ressurreição. A ordem dos acontecimentos é clara: após a morte a alma é ELEVADA (aqui, obviamente, só pode ser uma referência aos CÉUS) para Cristo e, depois, o corpo, agora ressurreto, será UNIDO À ALMA. Note: a ALMA não irá a lugar algum, mas o CORPO ressurreto irá ao seu encontro. Não há, também, qualquer afirmação que, sequer, sugira uma mudança de LUGAR em relação ao lugar onde a Alma já se encontrava.
3º) CÂNONES DE DORT:
Diz que os "pecados diários de fraqueza surgem e até as melhores obras dos santos são imperfeitas [...]. Também são motivos para ansiar pela meta da perfeição. Eles fazem isto até que possam reinar com o cordeiro de Deus nos CÉUS, finalmente livres deste corpo de morte" (5º Capítulo da doutrina: Perseverança dos Santos, Artigo 2º).
Percebe-se claramente que a expectativa dos teólogos que prepararam a "Contra-Remonstrance" era de que a morada final do justo é o CÉU e não a TERRA, ainda que restaurada.
4º) CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER
Afirma claramente que "A alma dos justos, sendo aperfeiçoada em santidade, é recebida no mais alto dos CÉUS, onde contempla a face de Deus em luz e glória, esperando a plena redenção do corpo deles"; a alma dos ímpios é lançada no inferno [...]. Além desses dois lugares destinados às almas separadas de seus respectivos corpos, a Escritura não reconhece outro lugar (Capítulo XXXII.I, Do Juízo Final).
A seção I desse capítulo está realmente tratando do que a teologia Reformada chama de "estado intermediário da alma". Contudo, é preciso entender que o "estado intermediário" o é em relação à CONDIÇÃO DA ALMA e não ao LUGAR onde ela se encontra, nos CÉUS. Ou seja, o estado do homem é intermediário porque ainda não está em seu estado final e definitivo, o que só ocorrerá quando sua alma for unida ao seu corpo novamente; aí, sim, teremos o "estado final", o corpo glorificado. Portanto, é absolutamente errado pensar que o "estado intermediário" se refere ao LUGAR onde a alma se encontra, como se ela depois fosse morar em um LUGAR definitivo, que segundo o Drº Heber, seria a TERRA.
É de se estranhar ainda a falta de dúvida que os ÍMPIOS PERMANECERÃO no INFERNO, mesmo após a re-união de seus corpos "ressuscitados para a desonra" com suas almas, que já se encontravam no INFERNO, como nos diz essa mesma seção da Confissão de Fé de Westminster, transcrita acima. Ou seja, SE OS ÍMPIOS NÃO MUDARÃO DE ENDEREÇO E PERMANECERÃO NO INFERNO (e ninguém discorda disso), ONDE SUAS ALMAS OUTRORA JÁ DESENCARNADAS JÁ ESTAVAM, PORQUE, ENTÃO, OS JUSTOS HAVERIAM DE MUDAR DOS CÉUS, ONDE IGUALMENTE SUAS ALMAS JÁ ESTAVAM, PARA A TERRA?
A seção II, desse mesmo capítulo, confirma nossa argumentação acima, quando afirma que "No último dia [...], todos os mortos serão ressuscitados com seu próprio corpo, e não outro [...] E SE REUNIRÃO NOVAMENTE À SUA ALMA, PARA SEMPRE (Capítulo XXXII.II, Do Juízo Final). Obviamente que essa seção já trata do ESTADO FINAL dos justos.
Para solucionar o problema da MORADA FINAL DOS JUSTOS, basta tão somente fazer DUAS perguntas:
PRIMEIRA PERGUNTA: Em que lugar estava a ALMA dos JUSTOS, em seu estado intermediário? A essa pergunta só cabe uma resposta possível: no CÉU (A alma dos justos, sendo aperfeiçoada em santidade, é recebida no mais alto dos CÉUS).
SEGUNDA PERGUNTA: Em que lugar os CORPOS RESSURRETOS encontrarão as respectivas ALMAS? Ora, como consequência da primeira resposta, só uma é possível a essa também é: no CÉU.
A expressão "PARA SEMPRE", no final da seção II, sugere que não haverá mudança alguma depois dessa união da ALMA com seu respectivo corpo RESSURRETO.
No capítulo VIII, que trata de "Cristo, o Mediador", afirma: "[...] ao terceiro dia ressuscitou dos mortos, com esse corpo subiu ao CÉU, onde está sentado à destra do Pai. [...] para todos aqueles que o Pai lhe deu, adquiriu não só a reconciliação, como também uma HERANÇA PERDURÁVEL NO REINO DOS CÉUS", não na Terra, ainda que a "nova" e não provisória, mas PERDURÁVEL.
No capítulo XXIII, que trata do "Magistrado Civil", afirma: "Os magistrados civis não podem tomar sobre si a administração da Palavra e dos Sacramentos, ou o poder das chaves do Reino do CÉU". Aqui está mais uma vez claro que quando o assunto é salvação, vida eterna, na perspectiva dos Puritanos, a palavra de ordem é CÉU, e, não, Terra, ainda que restaurada.
No capítulo XXV, que trata da "Igreja", afirma: "As igreja mais puras debaixo do CÉU estão sujeitas à mistura e ao erro". Aqui fica claro que os "delegados de Westminster" entendiam o CÉU (onde os justos morarão, final e eternamente) como um lugar específico, diferente da Terra (onde moravam), diferente do inferno (onde os ímpios morarão eternamente) e diferente, também, de um conceito subjetivo de "condição de espírito".
No Capítulo XXX, que trata das "Censuras eclesiásticas", afirma: "A esses oficiais estão entregues as chaves do Reino dos CÉU". Mais uma referência soteriológica que aponta para o CÉU, jamais para a Terra, ainda que restaurada.
5º) CATECISMO MAIOR DE WESTMINSTER:
Confirma a afirmação da Confissão de Fé de Westminster, de que a ALMA dos justos são "recebidas nos mais altos CÉUS (Pergunta 86), sendo posteriormente unidas aos seus respectivos corpos, além de outras afirmações sobre as ALMAS dos ímpios, que serão lançadas no inferno, onde permanecerão, mesmo depois da RE-UNIÃO com seus respectivos corpos desonrados; e que tudo isso é "PARA SEMPRE" (Pergunta 87),
Afirma ainda que, depois da ressurreição, os ímpios terão a sentença condenatória proferida contra si e serão "lançados NO INFERNO, para serem punidos com tormentos indizíveis do CORPO e da ALMA, com o diabo e seus anjos PARA SEMPRE (Pergunta 88). Note que, assim como a confissão de Fé, o Catecismo Maior também entende que "uma vez no inferno (no chamado estado intermediário), sempre no inferno (no estado final, com a alma já unida ao corpo). Ou seja, novamente: os ÍMPIOS não mudarão seu lugar de morada eterna, porque os JUSTOS haveriam de sofrer essa mudança?
Além disso, afirma que "no dia do Juízo, os justos (que estiverem vivos), sendo arrebatados para encontrar a Cristo nas nuvens [...] se unirão com ele para julgar os reprovados, anjos e homens, e serão RECEBIDOS NO CÉU, onde viverão, plenamente e PARA SEMPRE [...] na companhia de inumeráveis santos e ANJOS" (Pergunta 90).
Aqui cabe uma simples pergunta, que desmontará o argumento, pelo viés confessional, de que a morada final dos justos será na TERRA: Em que lugar os ANJOS morarão eternamente? Obviamente que a essa pergunta também só cabe uma resposta: no CÉU.
Em resposta à pergunta 53 - Como foi Cristo exaltado na sua ascensão - responde: [...] em subir aos mais altos CÉUS [...] para ali, à destra de Deus, aparelhar-nos um lugar onde Ele está [...]. Notem: Cristo, nos CÉUS, irá aparelhar-nos um lugar. No dizer do próprio Cristo, ele foi "preparar-vos lugar" (João 14:1-3).
Em resposta à pergunta 55 - Como faz Cristo a intercessão - responde: "Cristo faz intercessão [...] perante o Pai no CÉU, pelo mérito de sua obediência e sacrifício cumpridos na Terra". Na linguagem de Westminster só existe CÉU, TERRA e INFERNO.
CONCLUSÃO:
Parece claro, em nossa opinião, que além das CONFISSÕES e CATECISMOS REFORMADOS ensinarem sobre a MORADA FINAL DOS JUSTOS, bem como dos Ímpios, ainda que de forma não exaustiva, TAMBÉM ensinam que ESSA MORADA será no CÉU e não na TERRA, ainda que restaurada, como ensinam o Drº Heber Campos ladeado de um número enorme de Reformados. Portanto, incorrem em desobediência confessional, em nossa opinião, especialmente os que são obrigados a subscreverem os Símbolos de Fé de Westminster, aqueles que ensinam ao contrário, isto é, que a MORADA FINAL DOS JUSTOS será na TERRA e não no CÉU. A única exceção possível para uma não quebra de confessionalidade, mantendo-se a ideia de uma suposta MORADA FINAL DOS JUSTOS na "NOVA TERRA", restaurada, seria se ela fosse pensada como um sinônimo do CÉU.
Nunca é demais lembrar: os Catecismos e Confissões Reformados não são a própria Escritura. São interpretações possíveis dessa Escritura. Por óbvio, reconhecemos que existem outras interpretações. Contudo, aqueles que fazem parte de uma igreja confessional, como é a igreja Presbiteriana, por exemplo, se veem obrigados, por força de consciência, de lógica e de coerência, a adotarem a interpretação da Confissão de Fé e dos Catecismos de Westminster como interpretação oficialmente adotada, como é afirmado logo no 1º Artigo de sua Constituição: "NATUREZA, GOVERNO E FINS DA IGREJA: Art. 1º. A Igreja Presbiteriana do Brasil é uma federação de igrejas locais, que adota como única regra de fé e prática as Escrituras Sagradas do Velho e Novo Testamentos e como sistema expositivo de doutrina e prática a sua Confissão de Fé e os Catecismos Maior e Breve". Deve-se ressaltar ainda que "Em 1988, reunião extraordinário do Supremo Concílio, modificou a CI, de: [...] sistema expositivo, para [...] sistema impositivo", segundo Solano Portela, em seu site, em um artigo cujo título é "A Confissão de Fé de Westminster e os Votos de Ordenação na Igreja Presbiteriana".