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sábado, 6 de junho de 2009

NOÇÕES DE HISTÓRIA DA FILOSOFIA


PERÍODO PRÉ-FILOSÓFICO OU MITOLÓGICO
É um erro pensar que as pessoas que viveram nesse período (antes do Século VII a.C) não eram pessoas questionadoras - ainda que num nível elementar - pois essa é uma característica peculiar do ser humano. A criança, por exemplo, já nasce com o “espírito filosófico”, direcionando suas infindáveis perguntas e questionamentos sobre tudo o que consegue ver. Aos poucos, sem perceber, os próprios pais, e depois a sociedade, começam a calar esse “espírito inquiridor”, conformando-o ao sistema já existente. Em última análise, nascemos “filósofos” e somos forçados a abandonar esse modelo de vida. O que, de fato, diferencia as pessoas que viveram nesse período - que classificamos como pré-história da filosofia - não são as perguntas, os questionamentos. Esses são sempre os mesmos em qualquer época. O que muda são as respostas. Aqui as respostas às inquietações do homem são trazidas pelos mitos e pelas religiões primitivas. Essas respostas, ainda que, geralmente, sem logicidade e com forte apelo dogmático, são suficientes para calar os anseios e os medos do homem, diante de manifestações portentosas da natureza. Como explicar o trovão? Devo ter medo? Representa um perigo para minha vida? O que devo fazer para não correr riscos? O que é essa manifestação? Notem que são perguntas investigativas, questionadoras, de alguém que quer conhecer um fato/fenômeno novo. O mito nórdigo do “Poderoso Thor” é um bom exemplo desse tipo de resposta mítica. Segundo essa mitologia, a explicação para o fenômeno do trovão é a seguinte:

“Thor cruzava os céus num carro puxado por dois bodes. Quando navegava agitando o seu martelo, provocava raios e trovões. A palavra «trovão» – Thor-don em norueguês - significa o rugido de Thor. Desse modo a mitologia de Thor explicava o relâmpago, o trovão e a chuva. Os homens ficavam mais tranqüilos porque estavam «entendendo» alguma coisa do seu dia e vida e do mundo. Trovão, relâmpago e chuva no agito do martelo do deus faziam os campos crescerem. Ele era considerado o deus da fertilidade! Assim, como conseqüência do seu imenso martelo as sementes germinavam. Ninguém sabia como germinavam, mas a chuva era fundamental. O Thor mais ainda. Estavam unidos. Um deus popular e importante no tempo dos vikings”. Para saber mais sobre Thor, acesse: http://www.jornaldapaulista.com.br/site/page.php?key=849).

Para relembrar:


Segundo Eliade “dizer um mito é proclamar o que se passou na origem. Uma vez dito, o mito torna-se verdade: funda a verdade absoluta. O mito conta uma história sagrada. - É assim, porque foi dito que é assim, declaram os Eskimós, afim de justificarem a validade da sua história sagrada e de suas tradições religiosas” (CORDI, 2008, p.14).

Uma característica peculiar dos mitos é a aceitação dogmática de seu relato. São consideradas verdades absolutas porque, geralmente, quem trás o relato tem algum tipo de autoridade religiosa reconhecida. Os fatos são passados de forma hereditária e as pessoas vão absorvendo essas as respostas sem maiores questionamentos, o que é próprio dos dogmas, que existem para serem aceitos e não questionados.

Veja também o vídeo que demonstra de forma bem interessante como se dá o processo de aceitação da verdade mitológica. Demonstra as pessoas formatando suas atitudes, medos, crenças e abrandamento das causas de seus medos, com base no que foi relatado por seus antecessores. Geralmente, essas crenças estão associadas a fenômenos da natureza, como relâmpagos, trovões, chuvas ou ainda a sacrifícios requeridos por certas "divindades". Observe a atitude da tribo e suas cerimônias:



PRIMEIRA RUPTURA DE PARADIGMAS

Referimo-nos, quando falamos em “primeira ruptura”, à mudança radical que houve entre o período mitológico e a primeira era da história da filosofia: A antiga.

Chauí, em sua obra “Convite à filosofia”, faz uma pergunta muito pertinente com relação a essa transição do modo mítico de explicação dos objetos/fenômenos para o modo filosófico. Diz ela: “A filosofia nasceu realizando uma transformação gradual nos mitos gregos ou nasceu por uma ruptura radical com os mitos?” (CHAUÍ, 2006, p.34).

A essa pergunta respondemos que houve, de fato, uma ruptura radical e absoluta; uma verdadeira mudança de paradigma, uma forma completamente nova de respostas. Os primeiros filósofos não aceitavam mais as respostas pré-fabricadas, anteriormente fornecidas pelos mitos e religiões primitivas.

O vídeo a seguir demonstra as principais diferenças entre o pensamento mítico e o pensamento filosófico, chamando a atenção para a impossibilidade de aceitação simultânea dessas duas formas de pensamento:



1. NOÇÕES DE HISTÓRIA DA FILOSOFIA

Sinteticamente a História da Filosofia poderá ser dividida da seguinte forma: 

PERÍODO PRÉ-FILOSÓFICO

1.1 HISTÓRIA DA FILOSOFIA ANTIGA
1.1.1 PERÍODO PRÉ-SOCRÁTICOS
1.1.2 PERÍODO SOCRÁTICO OU CLÁSSICO
1.1.3 PERÍODO PÓS-SOCRÁTICO

1.2 HISTÓRIA DA FILOSOFIA MEDIEVAL
1.2.1 PATRÍSTICA
1.2.2 ESCOLÁSTICA
1.3 HISTÓRIA DA FILOSOFIA MODERNA/CONTEMPORÂNEA

Um fato digno de registro é que, cada período da história da filosofia, possui uma ênfase específica.
Essa ênfase não era definida pelos filósofos. Eles apenas observavam o que estava preocupando o povo e pensavam a respeito do assunto. Isso denota, de forma muito clara, que os filósofos eram pessoas “antenadas” com os seus respectivos momentos históricos. Significa dizer (o fato de cada período da história da filosofia possuir uma ênfase específica) que eles eram pessoas preocupadas em contribuir, com suas reflexões, para suas respectivas sociedades e que não eram pessoas alienadas, como ingenuamente supõem alguns.

Para entendemos melhor o processo de produção dos filósofos ao longo dos momentos históricos observemos o seguinte: Qual o critério que utilizaríamos para escolher um assunto para uma abordagem e reflexão filosófica hoje, considerando nossas preocupações? Certamente escolheríamos assunto da violência porque todos concordam que esse é um assunto que mais preocupa a sociedade, no momento. Assim também ocorreu com os filósofos. Pensaram sobre os assuntos específicos do seu contexto social e histórico. Luckesi confirma o que acabamos de expor acima. Diz ele:

Os pensadores trabalhavam filosoficamente sobre as emergências do seu lugar e do seu tempo [...] chegaram a determinadas soluções respondendo às necessidades emergentes de sua circunstância histórica” (LUCKESI, 2004, p.114).

Abordaremos agora, de forma mais detalhada, cada período da história da filosofia: 


1.1 HISTÓRIA DA FILOSOFIA ANTIGA

Os primeiros filósofos romperam, como já dissemos, totalmente com a estrutura mitológica. A filosofia possui tempo e espaço de início muito bem definidos. Nasce na Grécia antiga, no século VI a.C. A filosofia é essencialmente ocidental.

Muito embora alguns historiadores utilizem o termo “filosofia oriental”, para o tipo de construção metafísica do oriente, não há base técnica para reconhecer esse pensamento como filosofia, uma vez que possui uma aproximação extremamente grande com as questões religiosas e, consequentemente, com respostas pré-fabricadas advindas de muitos líderes religiosos “iluminados”, o que é totalmente contrário ao espírito filosófico. Vejamos a opinião de dois ícones da filosofia sobre a impossibilidade de ser o pensamento oriental considerado como filosofia:

“Seja como termo, seja como conceito, a filosofia é considerada pela quase totalidade dos estudiosos como criação própria do gênio dos gregos. Efetivamente, enquanto todos os outros componentes da civilização grega encontram correspondência aos demais povos do oriente (crenças e cultos religiosos, manifestações artísticas....), no que se refere à filosofia nos encontramos diante de um fenômeno tão novo que não somente não encontramos uma correspondência precisa junto a esses povos, mas não há tampouco nada que lhe seja estreita e especificamente análogo. Sendo assim [...] a filosofia constitui novidade que, em certo sentido, é absoluta. Quem não tomar isso em conta não poderá compreender porque, sob o impulso dos gregos, a civilização ocidental tomou uma direção completamente diferente da oriental. Em particular não poderá compreender por que motivo os orientais, quando quiseram se beneficiar da ciência ocidental e de seus resultados, tiveram que adotar também algumas categorias da lógica ocidental. Com efeito, não é em qualquer cultura que a ciência é possível [...] em função de suas categorias racionais, foi a filosofia que possibilitou o nascimento da ciência, e, em certo sentido, a gerou [...]. Está demonstrado historicamente que os povos orientais com os quais os gregos tinham contato possuíam verdadeiramente uma forma de “sabedoria”, feita de convicções religiosas, mitos teológicos e “cosmológicos”, mas não uma ciência filosófica baseada na razão pura. Ou seja, possuíam um tipo de sabedoria análoga à que os próprios gregos possuíam antes de criar a filosofia (REALE, ANTISERI, 1990. p.13).

Ainda sobre essa impossibilidade da existência de uma filosofia eminentemente oriental, Marilena Chauí afirma o seguinte:

“Dizer que a filosofia é tipicamente grega [...] não significa, evidentemente, que outros povos tão antigos ou mais antigos como os chineses, japoneses, árabes, hebreus, não possuíam uma sabedoria [...]. quando se diz que a filosofia é um fato grego, o que se quer dizer é que ela possui certas características, apresenta certa forma de pensar e de exprimir os pensamentos, estabelece certas concepções sobre o que seja a realidade, a razão, a linguagem, a ação, as técnicas, completamente diferentes das de outros povos e outras culturas” (CHAUÍ, 2006. pg.26).

A História da Filosofia Antiga, por sua vez, pode ser subdividida em três períodos menores:

1.1.1 Os Pré-Socráticos – Período Cosmológico
Podemos afirmar que foi a primeira corrente de pensamento filosófico, surgida na Grécia Antiga, por volta do século VII a.C. Os filósofos que viveram antes de Sócrates (Pré-Socrático) se preocupavam muito com o universo e com os fenômenos da natureza (questões cosmológicas). Buscavam explicar tudo através da razão. Essa ênfase se dá devido a proximidade desses filósofos com o período imediatamente anterior – o mitológico -. Nessa época as pessoas ansiavam ainda por respostas ligadas às origens das coisas, à cosmologia. Os principais filósofos pré-socráticos são os seguinte:

Tales de Mileto (624-548 a.C.)
Anaximandro de Mileto (611-547 a.C.)
Anaxímenes de Mileto (588-524 a.C.)
Parmênides de Eléia
Heráclito
Empédocles
Demócrito e a Teoria Atômica
Xenófanes de Colofon
Pitágoras de Samos
Escola Eleática
Empédocles de Agrigento
Leucipo
Anaxágoras de Clazômena

Destacaremos três desses filósofos para conhecermos um pouco mais de suas interessantes teorias:

Tales de Mileto (624-548 a.C.): Tales foi um dos filósofos que acreditava que as coisas têm por trás de si um princípio físico, material, chamado arqué. Para Tales, o arqué seria a água. Tales observou que o calor necessita de água, que o morto resseca, que a natureza é úmida, que os germens são úmidos, que os alimentos contêm seiva, e concluiu que o princípio de tudo era a água. Com essa afirmação deduz-se que a existência singular não possui autonomia alguma, apenas algo acidental, uma modificação. A existência singular é passageira, modifica-se. A água é um momento no todo em geral, um elemento. Tales com essa afirmação queria descobrir um elemento físico que fosse constante em todas as coisas. Algo que fosse o princípio unificador de todos os seres.

Heráclito (c. 540-480 a.C.): Heráclito propunha que a matéria básica do Universo seria o fogo. Pensava também que a mudança constante, ou o fluxo, seria a característica mais elementar da Natureza. Podemos talvez dizer que Heráclito acreditava mais do que Parmênides naquilo que percebia. Tudo flui, disse Heráclito. Tudo está em fluxo e movimento constante, nada permanece. Por conseguinte, “não entramos duas vezes no mesmo rio”. Quando entro no rio pela segunda vez, nem eu nem o rio somos os mesmos.

Demócrito (460 a.C): Demócrito foi o primeiro a formular uma Teoria Atômica. Para ele, as transformações que se pode observar na natureza não significavam que algo realmente se transformava. Ele acreditava que todas as coisas eram formadas por uma infinidade de "pedrinhas minúsculas, invisíveis, cada uma delas sendo eterna, imutável e indivisível". A estas unidades mínimas deu o nome de ÁTOMOS. Átomo significa indivisível, cada coisa que existe é formada por uma infinidade dessas unidades indivisíveis.

A importância desses filósofos foi tão grande, como pioneiros, que não deve haver a preocupação se eles estavam certos ou errados em suas teorias. Precisamos entender que estamos diante do “nascedouro” da filosofia, diante de um modelo ainda embrionário. O que realmente importa nesse período é o fato que esses filósofos não aceitavam mais as respostas prontas fornecidas pelos mitos.

Eles mesmos produziam, após muita investigação reflexiva, suas próprias respostas. É realmente impressionante percebermos como alguém, “do zero”, consegue estabelecer as bases para uma das teorias mais importântes da humanidade: a teoria atômica.

Para saber mais sobre os pré-socráticos acesse:
http://www.consciencia.org/pre_socraticos.shtml 

1.1.2 Período Clássico ou Socrático
Os séculos V e IV a.C. na Grécia Antiga foram de grande desenvolvimento cultural e científico. O esplendor de cidades como Atenas, e seu sistema político democrático, proporcionou o terreno propício para o desenvolvimento do pensamento. É a época do grande pensador Sócrates. Ele começa a pensar e refletir sobre o homem (questões antropológicas). Para ele, a verdade está ligada ao bem moral do ser humano. Ele não deixou textos ou outros documentos, desta forma, só podemos conhecer as idéias de Sócrates através dos relatos deixados por Platão, que foi discípulo de Sócrates e defendia que a realidade não estava no físico, no palpável e sim no mundo das idéias. Os pensadores teriam a função de entender o mundo da realidade, separando-o das aparências. Platão desenvolveu a famosa “alegoria da caverna” com o objetivo de demonstrar o que aconteceu com Sócrates, que foi condenado à morte, por tentar abrir os olhos das pessoas contra as várias espécies de manipulações; além disso, nessa alegoria Platão estabelece as bases para sua teoria do conhecimento. Outro grande filósofo desta época foi Aristóteles que desenvolveu os estudos de Platão e Sócrates. Foi Aristóteles quem desenvolveu a lógica dedutiva clássica, como forma de chegar ao conhecimento científico. A sistematização e os métodos devem ser desenvolvidos para se chegar ao conhecimento pretendido, partindo sempre dos conceitos gerais para os específicos.

Nessa época também viveram os Sofistas, de onde surge a palavra sofisma. Sequiosos de conquistar fama e riqueza no mundo. Tornaram-se mestres de eloqüência, de retórica, ensinando aos homens ávidos de poder político a maneira de conseguir, ainda que por meios não lícitos, como o engano pela retórica. Esse legado é absorvido até hoje por muitos políticos. Foram muito combatidos por Sócrates.


1.1.3 Período Pós-Socrático

Está época vai do final do período clássico (320 a.C.) até o começo da Era Cristã, século I d.C, dentro de um contexto histórico que representa o final da hegemonia política e militar da Grécia.

Nesse período há um choque entre os filósofos Pós-Socráticos e o Cristianismo, que estava em pleno crescimento: de um lado os filósofos ensinavam que o mais importante da vida é o prazer; não importando os meios para consegui-lo e do outro o Cristianismo com seus freios éticos e morais.

O ensinamento, principalmente, dos Epicureus, acabam explicando porque temos, nesse período, relatos de homens que ficaram conhecidos como os mais devassos da história da humanidade, a exemplo de Calígula, Nero e tantos outros. Alexandre o grande também é desse período.

É interessante notarmos como a filosofia, diferentemente do que muitos pensam, acaba influenciando, na prática, a vida das pessoas. Destacamos nesse período:

ESTOICISMO: O fundador da escola estóica foi Zenão da ilha de Chipre (334 a. C.). A filosofia é cultivada unicamente em vista da moral, para dar ao homem a virtude e a felicidade. O fim supremo é a virtude. A verdadeira virtude estóica é a indiferença e a renúncia a todos os bens do mundo, os quais não dependem de nós, porquanto nos podem ser tirados, e por conseguinte nos amargurar. Todo o nosso conhecimento deriva dos sentidos. Os estóicos como, por exemplo, Marco Aurélio e Sêneca, defendiam a razão a qualquer preço.

EPICUREUS: Fundada por Epicuro que nasceu em Atenas (341 a. C.). Os seguidores dessa corrente afirmam que o fim único da existência é o prazer. Prega o Ateísmo, o universalismo (o ideal do homem sem pátria) o individualismo, mas de uma maneira ainda mais explícita do que os céticos. Não há deuses nem Verdades pelas quais se deva viver ou morrer. O ateísmo e a descrença é, para ele, condição de felicidade humana. O que deve fazer o Homem, segundo Epicuro? Fugir de todo sofrimento, paixão e perturbação (páthos). O homem deve viver para buscar o Prazer (conforme http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_greco-romana). Há, contudo, uma acusação de que os historiadores cristãos da filosofia tenham transmutado o “prazer” de epiruco em “devassidão”, nos moldes do entendimento cristão de pecado. Mas, o que deve ficar claro é que ainda que essa teoria seja verdade, uma coisa não se pode negar: no mínimo a sociedade da época, principalmente os grandes imperadores romanos e líderes políticos, entenderam o prazer como uma forma de liberação dos “impulsos carnais ligados à toda liberalidade e ao sexo”. Isso se confirma pela grande concentração de pessoas, que tinham acesso a tal literatura, que viviam de forma desregrada e sem nenhum freio “ético ou moral”, buscando todo tipo de prazer; sexual, inclusive, a exemplo de Calígula.

CETICISMO : de acordo com os pensadores céticos, a dúvida deve estar sempre presente, pois o ser humano não consegue conhecer nada de forma exata e segura.

Um fato digno de registro demonstra bem esse choque ocorrido entre os filósofos Epicureus e Estóicos e o Cristianismo: é o fervoroso debate ocorrido entre o Apóstolo Paulo e esses filósofos. Um texto histórico riquíssimo, relatado nas Escrituras no livro de Atos dos Apóstolos 17:1-34, apresenta-nos esse debate filosófico (Paulo tem status de filósofo até mesmo para a academia):

“Tendo passado por Anfípolis e Apolônia, chegaram a Tessalônica, onde havia uma sinagoga de judeus. Paulo, segundo o seu costume, foi procurá-los e, por três sábados, arrazoou com eles acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos; e este, dizia ele, é o Cristo, Jesus, que eu vos anuncio. Alguns deles foram persuadidos e unidos a Paulo e Silas, bem como numerosa multidão de gregos piedosos e muitas distintas mulheres. Os judeus, porém, movidos de inveja, trazendo consigo alguns homens maus dentre a malandragem, ajuntando a turba, alvoroçaram a cidade e, assaltando a casa de Jasom, procuravam trazê-los para o meio do povo. Porém, não os encontrando, arrastaram Jasom e alguns irmãos perante as autoridades, clamando: Estes que têm transtornado o mundo chegaram também aqui, os quais Jasom hospedou. Todos estes procedem contra os decretos de César, afirmando ser Jesus outro rei. Tanto a multidão como as autoridades ficaram agitadas ao ouvirem estas palavras; contudo, soltaram Jasom e os mais, após terem recebido deles a fiança estipulada. E logo, durante a noite, os irmãos enviaram Paulo e Silas para Beréia; ali chegados, dirigiram-se à sinagoga dos judeus. Ora, estes de Beréia eram mais nobres que os de Tessalônica; pois receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras todos os dias para ver se as coisas eram, de fato, assim. Com isso, muitos deles creram, mulheres gregas de alta posição e não poucos homens. Mas, logo que os judeus de Tessalônica souberam que a palavra de Deus era anunciada por Paulo também em Beréia, foram lá excitar e perturbar o povo. Então, os irmãos promoveram, sem detença, a partida de Paulo para os lados do mar. Porém Silas e Timóteo continuaram ali. Os responsáveis por Paulo levaram-no até Atenas e regressaram trazendo ordem a Silas e Timóteo para que, o mais depressa possível, fossem ter com ele. Enquanto Paulo os esperava em Atenas, o seu espírito se revoltava em face da idolatria dominante na cidade. Por isso, dissertava na sinagoga entre os judeus e os gentios piedosos; também na praça, todos os dias, entre os que se encontravam ali. E alguns dos filósofos epicureus e estóicos contendiam com ele, havendo quem perguntasse: Que quer dizer esse tagarela? E outros: Parece pregador de estranhos deuses; pois pregava a Jesus e a ressurreição. Então, tomando-o consigo, o levaram ao Areópago, dizendo: Poderemos saber que nova doutrina é essa que ensinas? Posto que nos trazes aos ouvidos coisas estranhas, queremos saber o que vem a ser isso. Pois todos os de Atenas e os estrangeiros residentes de outra coisa não cuidavam senão dizer ou ouvir as últimas novidades. Então, Paulo, levantando-se no meio do Areópago, disse: Senhores atenienses! Em tudo vos vejo acentuadamente religiosos; porque, passando e observando os objetos de vosso culto, encontrei também um altar no qual está inscrito: AO DEUS DESCONHECIDO. Pois esse que adorais sem conhecer é precisamente aquele que eu vos anuncio. O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos humanas. Nem é servido por mãos humanas, como se de alguma coisa precisasse; pois ele mesmo é quem a todos dá vida, respiração e tudo mais; de um só fez toda a raça humana para habitar sobre toda a face da terra, havendo fixado os tempos previamente estabelecidos e os limites da sua habitação; para buscarem a Deus se, porventura, tateando, o possam achar, bem que não está longe de cada um de nós; pois nele vivemos, e nos movemos, e existimos, como alguns dos vossos poetas têm dito: Porque dele também somos geração. Sendo, pois, geração de Deus, não devemos pensar que a divindade é semelhante ao ouro, à prata ou à pedra, trabalhados pela arte e imaginação do homem. Ora, não levou Deus em conta os tempos da ignorância; agora, porém, notifica aos homens que todos, em toda parte, se arrependam; porquanto estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitando-o dentre os mortos. Quando ouviram falar de ressurreição de mortos, uns escarneceram, e outros disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasião. A essa altura, Paulo se retirou do meio deles. Houve, porém, alguns homens que se agregaram a ele e creram; entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros mais”.
Para saber mais sobre esse debate, acesse:
http://www.monergismo.com/textos/apologetica/Alan_Myatt_Apologetica5.pdf


1.2 HISTÓRIA DA FILOSOFIA MEDIEVAL

O pensamento na Idade Média foi muito influenciado pela Igreja Católica Romana[1]. Não é nenhum exagero afirmar que a igreja dominava todas as áreas do conhecimento. Desta forma, o teocentrismo acabou por definir as formas de sentir, ver e também pensar durante o período medieval.

Nesse momento a igreja é a responsável por dizer o que é e o que não é a verdade. Ou seja, há um retorno a uma situação muito semelhante ao período pré-filosófico, onde os mitos e as religiões primitivas também agiam dessa forma. Não precisamos mencionar o grande número de pessoas que foram queimadas vivas por discordarem da Igreja. Muitos padres e religiosos, inclusive.

Chamamos a atenção para a ausência de ruptura com o período imediatamente anterior (Filosofia Antiga). Os filósofos dessa época aceitavam, como grande contribuição, os escritos dos filósofos da antiguidade, tanto é assim que a ênfase desse período é justamente a tentativa de conciliar Fé e Razão, ou seja, os escritos filosóficos produzidos na antiguidade com as Escrituras Sagradas.

Esse período também pode ser subdividido da seguinte forma:

1.2.1 Patrística:

Período dos primeiros líderes do cristianismo pós era apostólica, chamados de “pais da igreja”, de onde vem a palavra Patrística. Destaca-se nesse período o grande filósofo Agostinho de Hipona, que viveu em meados do século IV d.C. Nesse momento ainda não temos a Igreja Católica Apostólica Romana com a configuração que temos hoje. Podendo ainda ser considerado como cristianismo primitivo. Essa configuração só acontece no século V d.C, com a chamada “pretensão Petrina” (ver nota 1).


1.2.2 Escolástica

A Escolástica representa o último período do pensamento cristão, que vai do começo do século IX até o fim do século XVI, isto é, da constituição do sacro romano império bárbaro, ao fim da Idade Média, que se assinala geralmente com a descoberta da América (1492). Este período do pensamento cristão se designa com o nome de escolástica, porquanto era a filosofia ensinada nas escolas da época, pelos mestres, chamados, por isso, escolásticos. Destaca-se, nesse período, Tomas de Aquino.


PERÍODO DE TRANSIÇÃO: RENASCIMENTO

Esse período que classificamos de transição é o período da Renascença. É Caracterizado por não ser da idade média nem da idade moderna; uma transição de fato que acabou culminando com a Reforma Protestante do século XVI, apesar disso, muitos historiadores consideram o Renascimento como parte integrante da Filosofia Moderna. Para saber mais sobre esse período que culminou com a reforma protestante acesse: http://pt.wikipedia.org/wiki/Renascimento

SEGUNDA RUPTURA DE PARADIGMAS

Chamamos de segunda ruptura de paradigmas, a repulsa dos filósofos da modernidade pela produção filosófica do período imediatamente anterior, isto é, Filosofia Medieval, período que foi, inclusive, denominado de “idade das trevas”. Os filósofos modernos não aceitavam mais os pressupostos e as respostas pré-fabricadas pela igreja romana. Mais uma vez o homem se lança a buscar as próprias respostas para seus questionamentos. Isso denota uma clara ruptura, completa e absoluta, com o paradigma imediatamente anterior.

1.3 HISTÓRIA DA FILOSOFA MODERNA/CONTEMPORÂNEA

Com o Renascimento Cultural e Científico, o surgimento da burguesia e o fim da Idade Média, as formas de pensar sobre o mundo e o universo ganham novos rumos.

A definição de conhecimento deixa de ser religiosa para entrar num âmbito racional e científico. O teocentrismo é deixado de lado e entre em cena o antropocentrismo (homem no centro do Universo ).


Todo esse período, que vai do século XV a pelo menos o século XVIII, muito embora alguns historiadores costumem incluir ainda o século XIX, que tem, de fato, a “cara” da modernidade, pode ser traduzido em uma única palavra: HUMANISMO. Evidentemente que o humanismo não é exclusividade da modernidade, contudo, em nenhum outro período ele deixou traços tão marcantes.



O Humanismo, como esse traço marcante, surgiu em 1453 quando Moemé II (1432-1481) invadiu Constantinopla (atual Istambul/Turquia). Isso fez com que muitos pensadores fugissem para a Itália, levando consigo manuscritos de Platão, Plotino, Aristóteles. Já na Itália, inicia-se a retomada da cultura greco-romana, dando início a um movimento importantíssimo, capaz de promover uma mudança de era, “rompendo com o medievalismo e iniciando e a época  moderna da humanidade” (VASCONCELOS, 2011, p.115):

O Humanismo pode, com razão, definir-se pela palavra: o homem potencializado, celebrado, exalado até à divindade, livre de si mesmo, dominador da natureza, senhor do mundo. E, logo, um paganismo ainda mais radical que o antigo, portanto espiritual e interior [...]. Essa é a alma, o significado, não o valor, do Humanismo e da Renascença: uma alma pagã (PADOVANE, 1990, p.261,262).

Podemos afirmar que a modernidade é, também, a inauguração de uma “nova cosmovisão”, que põe de lado o teocentrismo (Deus como centro do universo) e dá ênfase ao antropocentrismo (o homem como centro do universo); 

Essa mudança de paradigma afeta todas as áreas do conhecimento humano, inclusive a teologia. Basta olhar para o histórico debate entre Lutero e Erasmo de Roterdam, um influente humanista, sobre a vontade humana, além da pregação de  Finney (XIX), etc.

Segundo o importante historiador da Filosofia - Humberto Padovani -, A Filosofia Moderna pode ser dividida nos seguintes períodos:

1º Renascença e Reforma (Séculos XV e XVI);
2º Racionalismo (Século XVII),
3º Empirismo (Século XVII e XVIII),;
4º Iluminismo (Século XVIII),
 


PERÍODOS DA MODERNIDADE

1º RENASCIMENTO:

Para muitos historiadores, não há diferença intrínseca entre Humanismo e Renascimento, visto que: ambos valorizam o homem e a natureza, em oposição ao divino e ao sobrenatural. Do ponto de vista da cosmovisão cristã, não há nenhum problema na valorização do homem (coroa da criação) e da natureza, visto que são criação de Deus. O grande problema é o que caracterizou a modernidade: a oposição ao divino.

Diversos fatores contribuíram para esse impulso intelectual, que acabou por provocar a retomada dessa espécie mais acentuada do Humanismo, traduzida, aqui, como Renascimento, embrião da modernidade e a própria Modernidade:

a) Ascensão da burguesia (comerciantes) e declínio do feudalismo (cessão de terras em troca de serviços dos vassalos);  b) A expansão marítima, que modificou a ideia de mundo; E, talvez, o principal deles: c) A Reforma Protestante, iniciada no século XV, que contestou a autoridade da Igreja Católica, “transferindo a autoridade do Papa para a consciência do indivíduo, iluminada pela bíblia”. Conquanto a Reforma Protestante tenha sido fundamental para a ruptura definitiva com a era Medieval, e, consequentemente, para o início de outra era – a modernidade – ela não fez, obviamente, oposição ao divino. Pelo contrário, ela ajudou a entender adequadamente o homem, a natureza e o próprio Deus.

A  Modernidade surge, então, em meio a esse quadro de efervescência cultural, de conquistas de novos continentes, de valorização do ser humano, de Reforma religiosa e, principalmente,  de descobertas científicas (VASCONCELOS, 2011, p.116).

2º RACIONALISMO:

O racionalismo é uma corrente filosófica que concebe a razão como a principal fonte do conhecimento. Apesar de considerar que existe uma interação entre o sujeito cognoscente e o mundo sensível, a experiência sensorial/corporal é secundária e, por vezes, prejudicial ao conhecimento. Assim, no racionalismo, o corpo ocupa um lugar secundário ou é desconsiderado na compreensão dos fenômenos e na apreensão dos significados nas línguas.

Racionalista, Platão considerava a existência de dois mundos: i) o mundo sensível, percebido pelos sentidos e ii) o mundo inteligível, onde está o raciocínio e a intuição. Para ele, quando o homem observa a realidade, ideias inatas, anteriores ao contato cultural, vêm à tona. As coisas do mundo sensível são apenas cópias imperfeitas do mundo das ideias. Diz o filósofo que a alma participou do mundo das ideias antes de integrar-se a um corpo. Depois de integrada e encarnada ao mundo terreno, traz consigo ideias inatas daquele mundo, que se configuram como princípios gerais para a apreensão do conhecimento. Assim, para Platão, nada no mundo físico oferece ao homem o conhecimento real, uma vez que os objetos perceptíveis estão sempre mudando, enquanto suas essências são fixadas. Para conhecer, é preciso ir além do sentido. Tudo aquilo que está ligado à matéria, ao corpo e, portanto, à subjetividade impede a intelecção perfeita.

Considerado o pai do racionalismo moderno, Descartes acredita que a razão pode chegar ao conhecimento da realidade de forma parecida com o conhecimento matemático, em que se verificam princípios gerais desligados do mundo físico e que podem ser deduzidos quando se analisa um objeto ou fenômeno particular. Para Descartes (1979), o que a mente sabe são suas próprias representações ou ideias. O que o ser humano sabe mais intimamente não está em seus corpos, mas na estrutura de suas mentes, na natureza da racionalidade (JOHNSON, 1987, p. xxvi). Esse modelo de pensamento exclui, então, o corpo de suas considerações, visto que ele – o corpo – introduz elementos subjetivos no estudo da razão, vistos como irrelevantes para a natureza objetiva do conhecimento e do significado[1].


  3º EMPIRISMO:

Empirismo é uma teoria criada dentro da filosofia para afirmar a essência sensorial como parte do conhecimento. Dentro da epistemologia existem vários pontos de vista - o estudo do conhecimento humano juntamente com o racionalismo, o idealismo e o historicismo - e o empirismo faz parte desta gama de estudos, no entanto, atuando em um papel da experiência e da evidência, que inclui a experiência sensorial na formação de ideias inatas ou de tradições.

Os empiristas utilizam como argumento as tradições/costumes que surgem baseados nas relações de experiências sensoriais anteriores. Na filosofia, é a ciência que enfatiza evidências - principalmente pelo fato de se basear em experiências.

É considerada uma parte fundamental do método científico porque considera que todas as hipóteses e teorias devem ser testadas em oposição às observações do mundo atual. Apesar de sensorial, o empirismo atua além do raciocínio à priori, da intuição ou da revelação.

John Locke, considerado o 'pai' desta filosofia, explicitou em seu livro Ensaio sobre o Entendimento Humano, que a mente do homem pode se assemelhar a uma tabula rasa, onde ideias vão sendo gravadas por meio da experiência - e, então, o homem passa a formar sua opinião.

Essa análise empirista da epistemologia dá origem a outras duas ideias: a ideia simples, sobre a qual não se pode estabelecer distinções - como cores, texturas, etc - e a ideia complexa, que seriam associações das ideias simples. Isto daria origem ao conceito abstrato de substância material[2].





4º ILUMINISMO:

O século XVIII assistiu a uma revolução intelectual de enorme importância na História da Humanidade. A ela foi dado o nome de iluminismo ou filosofia das Luzes (na Península Ibérica, recebeu o nome de Ilustração). Por essa razão, o século XVIII é também conhecido como o Século das Luzes. As ideias iluministas caracterizavam-se por alguns princípios fundamentais, a saber: o racionalismo, o natu­ralismo, o liberalismo, a igualdade perante a lei e o anticlericalismo

Aproximação entre racionalismo e empirismo: a síntese kantiana:[3]

Vários filósofos tentaram unir racionalismo e empirismo, mas é em Kant que essa síntese se vê mais produtiva. Kant (1980) postulava que quase todo o conhecimento apreendido pelo homem inicia-se com a experiência. Na introdução da Crítica da razão pura, ele afirma:

Não há dúvida de que todo o nosso conhecimento começa com a experiência; do contrário, por meio de que a faculdade de conhecimento deveria ser despertada para o exercício senão através de objetos que toquem nossos sentidos e em parte produzem por si só suas próprias representações, em parte põem em movimento a atividade de nosso entendimento para compará-las, conectá-las ou separá-las e, desse modo, assimilar a matéria bruta das impressões sensíveis a um conhecimento dos objetos que se chama experiência? Segundo o tempo, portanto, nenhum conhecimento em nós precede a experiência, e todo o conhecimento começa com ela (KANT, 1980, I, 2, p. 23. Grifo do autor).


Como já dissemos, alguns historiadores costumam estender a Modernidade até o século XIX e parece ser lá, ainda por conta da última parte da História da Filosofia Moderna - o Iluminismo, que, direta ou indiretamente, acabou por servir de "maternidade", aonde realmente nasce ou cresce um definitivo “novo homem”, depois de uma longa gestação: um homem autônomo, órfão e ao mesmo tempo assassino de Deus. É um “super-homem” que resolve agora, sozinho, todos os seus problemas.


Foi um período extremamente próspero, tanto para a ciência quanto para a filosofia. As pesquisas agora já não mais tinham freios; não havia mais ninguém para dizer até onde se poderia ir, como na idade média.

Apesar de ter sido um período extremamente fecundo e com grandes nomes da filosofia, destacamos o filósofo Friedrich Nietzsche, pai do humanismo moderno (figura acima).

Ele, em nossa leitura da história, é o filósofo responsável pela “cara da modernidade”. É ele quem estabelece ou quem melhor finca as bases do pensamento “livre-de-Deus”, que é uma característica bem peculiar da modernidade. Vejamos um pouco mais sobre ele:

Friedrich Wilhelm Nietzsche nasceu a 15 de outubro de 1844 (SÉCULO IX). Heidegger disse ter sido Nietzsche o primeiro a conceber metafisicamente o momento em que "o Homem se apressa a assumir o poder na terra na sua totalidade".

Sobre esse novo homem, sobre esse super-homem, recaem pois todas a responsabilidades. Ele não tem mais para quem apelar tal como o último dos homens ainda fazia no santuário em ruínas do seu Deus morto.

O homem Nietzscheniano é um homem auto-suficiente. É um homem que dispensa a existência de um Deus que lhe auxilie. Na verdade, sua filosofia EXALTA o homem e DIMINUI Deus até fazê-lo sumir. Nietzsche é considerado, por sua obra, e pela sua exaltação do homem, como o pai do humanismo moderno.

Não é por acaso que a figura acima lembra o famoso “SUPER-HOMEM”, que surgiu precisamente pela influência da FILOSOFIA HUMANISTA, inclusive de Nietzsche.

É esta a ideia de homem da modernidade e que tem, muitas vezes sido perpetuada também na contemporaneidade.

Adolph Hitler certamente usou uma leitura da filosofia Nietniana de um "super-homem" para basear seus ideais Nazistas. Diz-se que a irmã de Nietzsche, que o acompanhou nos seus últimos tempos de vida, ofereceu a bengala de Nietzsche a Hitler.

Onde está Deus", ele gritava. "Eu devo dizer-lhes. Nós o matamos - vocês e eu. Todos somos assassinos... Deus está morto. Deus continua morto. E nós o matamos (Friedrich Nietzche, Gaia Ciência (1882), parte 125)

Evidentemente que essa ruptura abrupta com o medievo era necessária. Claro que, Em CERTO SENTIDO, Nietzche quando anuncia a “morte de Deus” e Marx quando afirma que a “Religião é o ópio do povo” tinham suas razões.

Ambos viviam ainda sobre a ira dos desmandos da igreja católica da era medieval e isso explica a rispidez. Contudo, podemos afirmar que “USARAM O REMÉDIO CERTO, MAS NA DOSE ERRADA”.

O homem, quer queiramos ou não, é constituído de elemento material, mas também espiritual.

Com as duas guerras mundiais, essa filosofia que norteou a idade moderna ficou enfraquecida e passou um breve período de tempo desacreditada, contudo, ainda é ela quem rege nossos dias. Vivemos sob os mesmos ideais da modernidade. Por conta disso, “verdade para nós é o que a ciência diz ser a verdade. Isso é tão forte quanto o dogmatismo medieval”.



ALGUNS DOS PRINCIPAIS FILÓSOFOS DA MODERNIDADE 


Francis Bacon (1561 – 1626). Estadista e filósofo da ciência inglesa. Em seu principal trabalho, “Novum Organum”, Bacon buscou renovar o sistema indutivo de lógica na interpretação da natureza.

Thomas Hobbes (1588 – 1626). Materialista inglês que acreditava ser a guerra o estado natural do homem. Em “Leviatã”, Hobbes traçou uma teoria de governo humano em que o estado e a subordinação do homem a ele formam a única solução para o egoísmo humano.

René Descartes (1596 – 1650). Dualista, racionalista e teísta francês cujo sistema “cartesiano” é a base de grande parte da filosofia moderna. Desenvolveu uma teoria de conhecimento que fundamenta a ciência e a filosofia modernas, com base na certeza da proposição “Penso, logo existo”.

Benedicti de Spinoza (1632 – 77). Metafísico racionalista holandês que desenvolveu as idéias de “Descartes” mas, rejeitava seu dualismo.

Gottfried Wilhelm von Leibniz (1646 – 1716). Idealista e absolutista alemão cujo otimismo foi ridicularizado por “Voltaire” em “Cândido”. Afirmava que a realidade consiste em unidades de força chamadas “mônadas”.

David Hume (1711 – 76). Empirista, filósofo e historiador escocês, que desenvolveu as idéias de “Locke” em sistema de ceticismo. De acordo com Hume, “o conhecimento humano é limitado à experiência de idéias e sensações cuja verdade não pode ser verificada”.

Jean-Jacques Rousseau (1712 – 78). Filósofo social e político francês, que definia um “retorno à natureza” para combater a desigualdade causada pela sociedade civilizada.

Immanuel Kant (1724 – 1804). Alemão, fundador da “Filosofia Crítica”. Inicialmente influenciado por “Leibniz” e depois por “Hume”, buscava um enfoque alternativo ao racionalismo do primeiro e ao ceticismo do segundo. Na “ética”, formulou o “imperativo categórico” que afirma: o que é aplicado a um dever, ser aplicado incondicionalmente a todos.




Para saber mais sobre a Filosofia Moderna acesse:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_moderna


E A FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA?

Não foi sem propósito que abordamos esse momento da história da filosofia juntamente com a filosofia moderna. Em nossa opinião, nada houve de extremamente grave e importante que justificasse uma mudança de “era” (DE MODERNA PARA CONTEMPORÂNEA).

Como já dissemos anteriormente, vivemos sob os mesmos pressupostos da modernidade; nada mudou. Não houve nenhuma mudança de paradigma que justificasse essa pretendida mudança de “era”, repetimos.

EXATAMENTE por conta dessa falta de um “fato grave” ou ainda de uma “mudança radical de paradigma de pensamento” que justifique uma mudança de “era” que no ORGANOGRAMA DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA pusemos uma espécie de CANAL DE COMUNICAÇÃO que interliga a modernidade com o que comumente se chama de contemporaneidade. Queremos dizer, com esse CANAL que ainda vivemos uma extensão da modernidade, pelas razões demonstradas acima, conforme grifos.

Em certo sentido, podemos afirmar que ainda vivemos na “Modernidade”.

Muitos historiadores, obviamente, utilizam a terminologia “Contemporânea”, outros, entretanto, seguindo mais ou menos a linda de raciocino que queremos empreender aqui, essa mesma “era” chamam de “pós-modernidade”. Atrevo-me, porém, a afirmar: ainda vivemos na modernidade.

Se quiser, entretanTo, saber mais do que se chama ortodoxalmente de “contemporaneidade”acesse:


Prof.MSc.Fábio Correia
Professor de Filosofia da Faculdade Decisão-PE


 [1] COMO A IGREJA SE TORNOU CATÓLICA: Até aproximadamente o ano 400 d.C, todas as Igrejas existentes se reuniam em concílios para tomar alguma decisão de caráter doutrinário. Isto fica evidente em Atos 15. Foi exatamente isso que promoveu a ligação da igreja nos mais variados pontos, passando a ser Católica (que quer dizer Universal), formando assim uma espécie de governo geral para todas as Igrejas, pois aceitavam a autoridade das decisões desses concílios. A partir daí vemos na Igreja Católica (universal), um processo de centralização de autoridade, com o aparecimento do Bispo com caráter monárquico, isto é, o Bispo que a principio é somente o dirigente de sua igreja local, surge como dirigente de várias igrejas. A idéia de Diocese (conjunto de igrejas) se fortalecia cada vez, tornando cada vez maior o poder dos Bispos. Num passo mais adiante no processo de centralização, os Bispos das províncias romanas tornaram-se, naturalmente, mais importante que os demais e foram chamados Bispos de suas dioceses. Continuando o processo de centralização, Cinco Bispos se destacaram e foram considerados Patriarcas, por serem Bispos de cidades importantes e influentes tanto na política como na economia do império. Foram eles: Bispo de Roma; Bispo de Constantinopla; Bispo de Alexandria; Bispo de Antioquia; Bispo de Jerusalém. COMO A IGREJA SE TORNOU ROMANA: Das cinco cidades patriarcais, duas eram as mais importantes: Roma e Constantinopla, pois eram capitais do Império Romano, do ocidente e do oriente, respectivamente. No V século, com a chamada pretensão petrina (que o apóstolo Pedro teria sido o primeiro Bispo de Roma, muito embora não haja nenhuma sustentação histórica desse fato. Sequer a provas concretas que Pedro tenha pisado em solo Romano), o Bispo de Roma fortaleceu-se e passou a ser a última palavra do Cristianismo, dominando e liderando as demais Igrejas e patriarcados, exceto o de Constantinopla que não se encurvou ao poderio do Bispo de Roma. Este patriarcado deu origem a Igreja católica Ortodoxa Grega, até hoje existente. Isto, na verdade, traz luz à pretensão católica romana que afirma ter sido a primeira e única igreja cristã, fundada por Cristo e por seus apóstolos. Como vimos, a igreja Ortodoxa Grega e outras são da mesma época de fundação da igreja romana.Também nesse período houve um grupo que se separou do patriarcado de Constantinopla e fundou outra Igreja independente, a Nestoriana (498 dC.).
[1] Via Litterae • Anápolis • v. 5, n. 1 • p. 53-74 • jan./jun. 2013 • http://www2.unucseh.ueg.br/vialitterae
[2] http://www.afilosofia.com.br/post/empirismo/593
[3] Via Litterae • Anápolis • v. 5, n. 1 • p. 53-74 • jan./jun. 2013 • http://www2.unucseh.ueg.br/vialitterae

quinta-feira, 28 de maio de 2009

OS CINCO PONTOS DO CALVINISMO

Introdução

Uma macro-visão da história da humanidade, facilmente, revelará, de forma sintomática, a tendência do homem em agrupar-se em sistemas de vida. Na antiguidade, numa era pré-filosófica, a vida dos seres humanos, com pontuais exceções, girava em torno dos mitos e das formas mais primitivas da religiosidade. Esse sistema de vida “alimentava” apenas um de seus elementos constitutivos – a alma – anulando, na maioria das vezes, seu outro elemento de constituição – o corpo – aqui entendido como racionalidade, como capacidade de solucionar problemas de sua exclusiva competência.
Com o surgimento da Filosofia, no século VII a.C., o homem migra para um novo sistema de vida. Dessa vez, o elemento constitutivo material do homem – o corpo – em sua expressão máxima – a racionalidade – tripudia sobre a alma. A máxima da antropologia socrática: “conhece-te a ti mesmo”, dá a tônica do novo sistema.
Cansado de alimentar apenas a razão – enquanto expressão máxima do elemento material – corpo -, mais uma vez, o “nômade homem” migra para mais um sistema. Dessa vez, para um sistema apenas reformulado, porém, não totalmente novo, que chamaremos de “a ditadura da alma”. Durante toda a Idade Média, a principal atividade desse sistema foi sufocar toda e qualquer expressão do elemento constitutivo material do homem. Ao menor sinal de rebelião da racionalidade, logo, a fogueira era acesa.

Não havendo como manter a fogueira sempre acesa, o homem prossegue no seu êxodo, em busca de um novo sistema de vida, passando repentinamente, por Genebra[1], fixa seus olhos em uma outra ditadura: “a ditadura do corpo” – da razão. Como é próprio das ditaduras, mais mortes deveriam ocorrer para que a eliminação do inimigo (a alma – entendida como expressão da religiosidade) fosse definitiva. Considerando a força do oponente demonstrada por séculos no comando do sistema, durante todo o medievo, a dose do remédio deveria ser não para curar, mas para matar, definitivamente. Com a modernidade (sistema de vida que transcende até a contemporaneidade), o homem assume como máxima de sua nova ditadura a anunciação “da morte de Deus”[2]: “Nenhum Deus, nenhum Senhor”, é a palavra de ordem. O homem assume, definitivamente, o cetro. O ideal científico procura a alma e já não a encontra; em seu lugar, ondas e teias cerebrais. Não há mais lugar para os “fracos providos de almas”, mas, apenas para o Super-Homem Nietzscheniano.

Como pudemos perceber acima, a busca cíclica do homem por novos sistemas de vida – ora beneficiando a alma (religiosidade) ora beneficiando o corpo (racionalidade), tende a continuar. O homem só se fixará em um sistema de vida quando assumir que sua natureza é diversa e dual, uma não é contra a outra, mas, pelo contrário, uma completa a outra e, ambas, precisam igualmente ser alimentadas. Voltemos então à Genebra!

O Calvinismo é um poderoso sistema de vida, hermeticamente fechado, que atende aos interesses mais profundos da humanidade, tanto da alma quanto da racionalidade. O Calvinismo reconhece Deus como Deus, soberano, acima de tudo e de todos; ao mesmo tempo em que põe o homem na sua situação de criatura decaída. O Calvinismo entende o homem e o próprio Deus, pelo prisma das Sagradas Escrituras; ao mesmo tempo que se distancia do misticismo, abrindo, com isso, uma importante janela para o desenvolvimento e a racionalidade, aproxima-se, de forma profunda e coerente, com a antropologia e teologia da revelação escrita.

Kuyper, comentando sobre o sistema de vida calvinista, faz a seguinte afirmação:

Não há dúvida, então, de que o Cristianismo está exposto a grandes e sérios perigos. Dois sistemas de vida estão em combate mortal. O Modernismo está comprometido em construir um mundo próprio a partir de elementos do homem natural, e a construir o próprio homem a partir de elementos da natureza; enquanto que, por outro lado, todos aqueles que reverentemente humilham-se diante de Cristo e o adoram como o Filho do Deus vivo, e o próprio Deus, estão resolvidos a salvar a “herança cristã”. Esta é a luta na Europa, esta é a luta na América, e esta também é a luta por princípios em que meu próprio país está engajado, e na qual eu mesmo tenho gasto todas as minhas energias por quase quarenta anos.Nessa luta apologética não temos avançado um único passo. Os apologistas invariavelmente começam abandonando a defesa assaltada, a fim de entrincheirarem-se covardemente em um revelim atrás deles. Desde o início, portanto, tenho sempre dito a mim mesmo, -“Se o combate deve ser travado com honra e com esperança de vitória, então, princípio deve ser ordenado contra princípio. A seguir, deve ser sentido que no Modernismo, a imensa energia de um abrangente sistema de vida nos ataca; depois também, deve ser entendido que temos de assumir nossa posição em um sistema de vida de poder, igualmente abrangente e extenso. E este poderoso sistema de vida não deve ser inventado nem formulado por nós mesmos, mas deve ser tomado e aplicado como se apresenta na História. Quando assim fiz, encontrei e confessei, e ainda sustento, que esta manifestação do princípio cristão nos é dada no Calvinismo (KUYPER, 2002, p.19).

1 Entendendo o contexto histórico

Os Cinco Pontos do Calvinismo foram formulados em resposta a um “documento” que ficou conhecido na história como “Remonstrance” ou “Protesto”, que fora apresentado ao Estado da Holanda pelos “discípulos” do professor de um seminário holandês chamado Jacob Hermann, cujo sobrenome latino era Arminius (1560-1600). Mesmo estando inserido na tradição reformada, Arminius tinha sérias dúvidas quanto à graça soberana de Deus, visto que era simpático aos ensinos de Pelágio e Erasmo, no que se refere à livre vontade do homem. Este documento formulado pelos discípulos de Arminius tinha como objetivo mudar os símbolos oficiais de doutrinas das Igrejas da Holanda (Confissão Belga e Catecismo de Heidelberg ), substituindo-os pelos ensinos do seu mestre. Desta forma, a única razão pela qual “Os Cinco Pontos do Calvinismo” foram elaborados era a de responder ao documento apresentado pelos discípulos de Arminius.

2 Analisando os cinco pontos do calvinismo

2.1 Depravação total

Para compreendermos bem a doutrina da salvação, é de fundamental importância entendermos também a antropologia Bíblica. Quem é o homem para Deus? O que a Bíblia fala acerca do homem? Possui o homem livre arbítrio? Das respostas a esses questionamentos virá, necessariamente, o remédio sotereológico. Exatamente essa discursão – motor desencadeador de todas as outras referentes à salvação – tem sido atualizada ao longo do tempo. Primeiramente por Agostinho e Pelágio e, posteriormente, atualizado, principalmente, por Calvino e Armínius. Sproul, citando Hornack, confirma a importância do debate, diz ele:

A questão entre Pelágio e Agostinho era clara. Não estava ofuscada por argumentos teológicos intricados, especialmente no começo. Nunca houve, talvez, uma outra crise de igual importância na história da igreja na qual os oponentes tenham expressado os princípios em debate tão clara e abstratamente. Somente a disputa Ariana pode ser comparada a ela (SPROUL, 2001, p.31).

Agostinho costumava dizer que a antropologia bíblica se divide em duas fases, com relação ao homem natural: a) Antes do pecado o homem podia não pecar; b) Depois do pecado o homem não pode não pecar. É nesse caminho também que trilha o calvinismo. Enquanto os arminianos defendem que a queda do homem não foi total e que, nesse homem, restou bem suficiente capaz de habilitá-lo a querer aceitar a Cristo como Salvador; os calvinistas afirmam, um após outro, que, com a queda, o homem tornou-se totalmente depravado, morto espiritualmente, e, como tal, não restou bem algum a fim, de sozinho, querer a Deus. Um dos principais documentos calvinistas, em seu capítulo sobre o livre arbítrio, expõe com clareza a antropologia bíblica e a situação do homem diante de Deus, pré-queda e pós-queda:

Deus dotou a vontade do homem de tal liberdade, que ele nem é forçado para o bem ou para o mal, nem a isso é determinado por qualquer necessidade absoluta da sua natureza. Ref. Tiago 1:14; Deut. 30:19; João 5:40; Mat. 17:12; At.7:51; Tiago 4:7. O homem, em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas mudavelmente, de sorte que pudesse decair dessa liberdade e poder.Ref. Ec. 7:29; Col. 3: 10; Gen. 1:26 e 2:16-17 e 3:6. O homem, caindo em um estado de pecado, perdeu totalmente todo o poder de vontade quanto a qualquer bem espiritual que acompanhe a salvação, de sorte que um homem natural, inteiramente adverso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu pr6prio poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso. Ref. Rom. 5:6 e 8:7-8; João 15:5; Rom. 3:9-10, 12, 23; Ef.2:1, 5; Col. 2:13; João 6:44, 65; I Cor. 2:14; Tito 3:3-5.(WESTMINSTER, 1999, p.23).

Após a entrada do pecado, isto é, da queda do homem, fato extremamente grave, na visão calvinista, não tanto na arminiana, a situação do homem muda terrivelmente. Vejamos também o testemunho de Lutero, por ocasião do seu debate com Erasmo de Roterdan, com relação ao homem pós-queda:

Erasmo [...] você assevera que o “livre-arbítrio” é a capacidade que a vontade humana tem, por si mesma, de decidir [...] Os pelagianos também fizeram isso. Mas você os ultrapassa! [...] Prefiro até mesmo o ensinamento de alguns dos antigos filósofos aos seus. Eles diziam que um homem entregue a si mesmo só faria o errado. O homem só poderia escolher o bom com a ajuda da graça divina. Eles diziam que os homens são livres para decair, mas que precisam de ajuda para elevarem-se! Porém, é motivo de riso chamar a isso de “livre-arbítrio”. Com base em tais conceitos, eu poderia afirmar que uma pedra tem “livre-arbítrio”, pois só pode cair, a menos que seja erguida por alguém! O ensino daqueles filósofos, põem, ainda é melhor do que o seu. A sua pedra, Erasmo, pode escolher se sobe ou desce! (LUTERO, 1988, p.41).

2.2 Eleição incondicional

O segundo ponto do Calvinismo, Eleição Incondicional, tem por objetivo combater o também segundo ponto do arminianismo – Eleição Condicional -. Armínius e seus seguidores acreditavam que Deus havia elegido os homens que elegeu baseado em seu pré-conhecimento ou presciência. Ou seja, Deus anteviu aquele que iria, por seu próprio mérito, (não podemos esquecer que o homem arminiano é um homem que ainda está habilitado, mesmo depois da queda, a buscar a Deus mesmo sem que, necessariamente, haja alguma intervenção divina para isto) crer Nele, e, por conta disso, o elegeu. Isso faz de Deus um mero jornalista que apenas registra os “atos soberanos” do homem.

No sínodo de Dort, foi elaborada a seguinte contra-argumentação, relativamente ao condicionamento ou não da eleição do homem, por Deus, a algum movimento ativo desse homem:

Esta eleição é o imutável propósito de Deus, pelo qual Ele, antes da fundação do mundo, escolheu um número grande e definido de pessoas para a salvação, por graça pura. Estas são escolhidas de acordo com o soberano bom propósito de sua vontade, dentre todo o gênero humano, decaído pela sua própria culpa de sua integridade original para o pecado e a perdição. Os eleitos não são melhores ou mais dignos que os outros, porém envolvidos na mesma miséria dos demais. São escolhidos em Cristo, quem Deus constituiu, desde a eternidade, como Mediador e Cabeça de todos os eleitos e fundamento da salvação (DORT, 1996, p.34).

Na visão calvinista, diferentemente da arminiana, nada havia no homem, que fosse condição, a seu favor, para que justificasse um merecimento, por menor que seja, muito menos ainda um merecimento do tamanho da salvação eterna. A eleição de Deus baseou-se exclusivamente por sua graça (que por definição já denota um favor não merecido) e imensa bondade. Isso faz de Deus o autor da salvação e não apenas um coadjuvante dos direcionamentos humanos.
Agostinho também subscrevia uma eleição incondicional, como afirma:

Procuremos entender a vocação própria dos eleitos, os quais não são eleitos porque creram, mas são eleitos para que cheguem a crer. O próprio Senhor revela a existência desta classe de vocação ao dizer: Não fostes vós que me escolhestes, mas fui eu que vos escolhi (Jo 15: 16). Pois, se fossem eleitos porque creram, tê-lo-iam escolhido antes ao crer nele e assim merecerem ser eleitos. Evita, porém, esta interpretação aquele que diz: Não fostes vós que me escolhestes (AGOSTINHO, 1999, p.194).

Analisemos o texto Escriturístico: “Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom, se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido, assentadas em pano de saco e cinza” (Lucas 10:13). Nesse texto, fica muito evidente que o decreto de Deus sobrepõe-se à sua presciência. Deus conhece todas as possibilidades, evidentemente, mas permite acontecer tão somente o que já de antemão decretou.

A confissão de Westminster, em seu capítulo sobre os “Eternos decretos de Deus”, faz as seguintes afirmações:

Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece [...]. Ref. Isa. 45:6-7; Rom. 11:33; Heb. 6:17; Sal.5:4; Tiago 1:13-17; I João 1:5; Mat. 17:2; João 19:11; At.2:23; At. 4:27-28 e 27:23, 24, 34. Ainda que Deus sabe tudo quanto pode ou há de acontecer em todas as circunstâncias imagináveis, ele não decreta coisa alguma por havê-la previsto como futura, ou como coisa que havia de acontecer em tais e tais condições Ref. At. 15:18; Prov.16:33; I Sam. 23:11-12; Mat. 11:21-23; Rom. 9:11-18. Segundo o seu eterno e imutável propósito e segundo o santo conselho e beneplácito da sua vontade, Deus antes que fosse o mundo criado, escolheu em Cristo para a glória eterna os homens que são predestinados para a vida; para o louvor da sua gloriosa graça, ele os escolheu de sua mera e livre graça e amor, e não por previsão de fé, ou de boas obras e perseverança nelas, ou de qualquer outra coisa na criatura que a isso o movesse, como condição ou causa. Ref. Ef. 1:4, 9, 11; Rom. 8:30; II Tim. 1:9; I Tess, 5:9; Rom. 9:11-16; Ef. 1: 19: e 2:8-9. (WESTMINSTER, 1999. p.13)

Como bem afirma Spencer: “Se a eleição dependesse do homem, ele nunca creria, porque o homem é totalmente depravado e incapaz de fazer aquilo que é bom aos olhos de Deus. Deixando a si mesmo para decidir-se por cristo, sem que antes a fé lhe seja outorgada por um ato de Deus, o homem nunca irá a Cristo”. (SPENCER, 1992. p.39).

3.3 Expiação limitada

O terceiro e, talvez, o mais polêmico (apenas aparentemente, porque, nada mais é, que um elo perfeito que liga ao ponto anterior e ao posterior) dos pontos do calvinismo, a Expiação Limitada, foi formulada para combater a idéia de Expiação (redenção) Universal, formulada pelos seguidores de Armínius. Para eles, a morte de Cristo foi extensiva a todos os homens, sem exceção. Uma pergunta, porém não quer calar: Teria Cristo morrido, de fato, também por aqueles que passarão toda a eternidade no inferno? Se a resposta a essa questão é afirmativa, teremos que, indubitavelmente, escolher entre estas duas proposições: ou o sacrifício de Cristo não foi tão perfeito e eficaz quanto pretendia ou Deus, ainda que tenha boa vontade em salvar esses indivíduos, chegando até a verter o sangue precioso do seu Unigênito Filho, não tem poder suficiente para levar a termo a sua própria vontade.
Em favor de quem Cristo morreu? Morreu por todos? Quais foram aqueles em favor dos quais derramou Ele o seu sangue?

A questão do propósito limitado da morte de Cristo (Expiação Limitada) tem sido alvo de inúmeras e intensas controvérsias. Certamente o nosso Senhor Jesus Cristo tinha alguma determinação absoluta em vista, quando subiu à cruz. Certamente tinha Ele um propósito bem definido, e assim sendo, necessariamente tinha que ser levado a efeito, tinha que ser cumprido. Se este propósito de Cristo incluísse a totalidade da humanidade, por certo, toda a humanidade teria de ser salva. E, isto, sabemos, não ocorrerá!. Cristo não morreu para possibilitar a salvação de toda a humanidade, mas para assegurar a salvação de todos aqueles que lhe tinham sido concedidos pelo Pai (Jo 10:29). Cristo não morreu simplesmente para possibilitar o perdão dos pecados, mas para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo (Hb 9:26-28).

3.3.1 Propósito Limitado da expiação

O propósito limitado da expiação é uma conclusão lógica da escolha eterna. Se Deus escolheu alguns desde o princípio e se a vontade de Cristo era a vontade do Pai (Hb 10:7; Jo 6:38), nada mais óbvio do que chegarmos à conclusão de que Cristo subiu naquela cruz apenas para salvar os que foram eleitos antes da fundação do mundo. Analisemos os textos: (Jo 6:37,39; 17:1,2,6,9 e 24).

Analisando a questão da expiação no V.T., em Levíticos 1:4-5 e outros textos, podemos ver que a culpa da pessoa era como que transferida para o animal. Aquele que oferecia o animal em sacrifício era considerado perdoado do seu pecado, da sua culpa. Uma vez por ano o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos para oferecer sacrifício, com sangue, por si e pelo povo (Lv 16:17-24, 23:28; Hb 9:7) e o povo era expiado, considerado perdoado. Diz-se que o animal expiou o pecado do povo, levando-o sobre si (Lv 16:21). De fato a expiação do V.T. era uma tipologia da morte de Cristo (GI 1:4; Hb 7:27; Rm 3:24-25).

Diante desses fatos bíblicos perguntamos: Em favor de quem foi oferecido este resgate? Ou quem foi expiado com a morte de Cristo? Se respondemos que tudo isto foi em prol da raça humana inteira, então foi cancelada a divida de todo ser humano. Se Cristo levou sobre si o pecado de toda a raça humana, então ninguém mais perecerá; ninguém sofrerá a condenação final. Deus não pode exigir o pagamento de uma divida por duas vezes. Uma vez do fiador, que derramou seu sangue, e depois outra vez da mão do devedor. Ou teria o sacrifício expiatório de Cristo sido insuficiente?

O fato é que Cristo não saldou a dívida de todos (1 Pd 3:19; Jo 8:21; Mt 25: 41). Dizer que Cristo morreu por todos é dizer que foi substituto e fiador de toda raça humana. Dizer que Cristo morreu por todos é dizer que Ele levou sobre si a maldição de muitos que agora levam sua própria maldição, é dizer que sofreu a punição de muitos que agora sofrem a sua própria punição no inferno.

Por outro lado, dizer que foi ferido pelas transgressões do povo de Deus, que deu sua vida em resgate de muitos e que morreu pelas suas ovelhas é dizer o que dizem as escrituras. Vejamos alguns textos: Ef 1:4,5;Jo 10:16; 13:1; 17:19; 10:11; 11:49-52; At 20:28; Mt 20:28 Is 53:8.

Quando Cristo deu a sua vida na cruz do Calvário, deu-a por suas ovelhas, os eleitos! Não são todos os homens que estão incluídos na expressão “minhas ovelhas”. Portanto, Cristo não deu sua vida por todos os homens. Aos que estavam ao seu redor, ele disse: “Mas vós não credes, porque não sois das minhas ovelhas” (Jo 10:26). Os reprovados, os não-eleitos, os descrentes não estão incluídos no número daqueles por quem Cristo deu a sua vida. Ele morreu só pelas suas ovelhas. (SPENCER, 1992. p.39).

3.4 Graça irresistível

Sendo o homem um ser “morto”, espiritualmente falando, e, por conta disso, não podendo oferecer, absolutamente, nada para ter sido escolhido, por algum mérito ativo, tendo tão somente sido eleito pela graça e misericórdia de Deus que, incondicionalmente, o resgatou da escuridão das trevas, não é de se admirar que o quarto ponto do calvinismo verse sobre a impossibilidade de uma resistência, por parte do homem, ao chamado divino. Esse ponto foi formulado em contra-argumentação da idéia arminiana que afirma: mesmo Deus querendo chamar o homem para dar-lhe salvação, esse pode, por seu poder e vontade resistir a esse chamado divino. Chega a ser inacreditável a inversão de valores promovida pela doutrina arminiana, que apresenta um Deus, cheio de boas intenções, mas que esbarra na vontade “soberana” do homem. É uma verdadeira aclamação ao humanismo de Nietzsche.

A Confissão de Fé de Westmister faz a seguinte afirmação sobre o chamado eficaz (apesar de irresistível o homem não é obrigado a atender ao chamado, contudo, seu coração é transformado, para, a partir de então “querer” e ter prazer nesse chamado) que Deus direciona ao homem:

Todos aqueles que Deus predestinou para a vida, e só esses, é ele servido, no tempo por ele determinado e aceito, chamar eficazmente pela sua palavra e pelo seu Espírito [...]. Isto ele o faz, iluminando os seus entendimentos espiritualmente a fim de compreenderem as coisas de Deus para a salvação, tirando-lhes os seus corações de pedra e dando lhes corações de carne, renovando as suas vontades e determinando-as pela sua onipotência para aquilo que é bom e atraindo-os eficazmente a Jesus Cristo, mas de maneira que eles vêm mui livremente, sendo para isso dispostos pela sua graça. Ref. João 15:16; At. 13:48; Rom. 8:28-30 e 11:7; Ef. 1:5,10; I Tess. 5:9; 11 Tess. 2:13-14; IICor.3:3,6; Tiago 1:18; I Cor. 2:12; Rom. 5:2; II Tim. 1:9-10; At. 26:18; I Cor. 2:10, 12: Ef. 1:17-18; II Çor. 4:6; Eze. 36:26, e 11:19; Deut. 30:6; João 3:5; Gal. 6:15; Tito 3:5; I Ped. 1:23; João 6:44-45; Sal. 90;3; João 9:3; João6:37; Mat. 11:28; Apoc. 22:17. Esta vocação eficaz é só da livre e especial graça de Deus e não provem de qualquer coisa prevista no homem; na vocação o homem é inteiramente passivo, até que, vivificado e renovado pelo Espírito Santo, fica habilitado a corresponder a ela e a receber a graça nela oferecida e comunicada. Ref. II Tim. 1:9; Tito 3:4-5; Rom. 9:11; I Cor. 2:14; Rom. 8:7-9; Ef. 2:5; João 6:37; Eze. 36:27; João5:25. .(WESTMINSTER, 1999. p.5)

Spencer faz a seguinte afirmação sobre essa chamada irresistível:

O homem não tem o poder para resistir a Deus, se Deus “quiser salvá-lo”. O homem não é apenas um poder de terceira classe, submetido ao deus dos mortos, mas não pode nem mesmo resistir a seus maus hábitos e às luxúrias de sua carne! O homem necessita que Deus o domine irresistivelmente por sua graça, pois, do contrário, o homem não poderá dar jamais um passo na direção de Cristo. Daí as palavras do Senhor: “Ninguém pode vir a mim se o Pai que me enviou não o trouxer” (Jo 6:44). (SPENCER, 1992. p.54).

3.5 Perseverança dos santos

Finalmente chegamos ao último ponto da doutrina calvinista. Aquele que é a conclusão obvia e lógica de todos os outros pontos e quer responder à seguinte questão: Pode o homem uma vez regenerado decair da graça? Perder a salvação? Esse ponto, assim como os outros, foi motivado pela doutrina arminiana que afirma: uma vez salvo por um ato de sua própria vontade livremente exercida, aceitando a Cristo por sua própria decisão, pode também perder-se depois de ter sido salvo. Para sermos bem sinceros, essa é a conclusão que todo arminiano deveria chegar, depois de toda a sua construção racional, mas não é bem isso que ocorre.
Os calvinistas, por sua vez, baseados na situação de morte espiritual do homem, no chamado eficaz de Deus, como única possibilidade de reverter quadro tão tenebroso, na sua graça, que não pode ser resistida e, principalmente, nas gotas benditas do sangue de Cristo vertido na cruz., em favor dos eleitos, afirmam que a salvação não pode ser perdida; primeiro por que é eterna; que por definição é algo que não pode ter fim, depois porque é o próprio Deus, único ativo no processo de salvação, que faz o homem reviver espiritualmente, quem o elege irresistivelmente, quem derrama o sangue para providenciar a expiação dos pecados e, finalmente, preserva a vida e a alma do eleito para todo o sempre.

Mais uma vez invocamos o testemunho, que é uma síntese das melhores confissões formuladas em todas as épocas, a Confissão de Fé de Westminster:

Os que Deus aceitou em seu Bem-amado, os que ele chamou eficazmente e santificou pelo seu Espírito, não podem decair do estado da graça, nem total, nem finalmente; mas, com toda a certeza hão de perseverar nesse estado até o fim e serão eternamente salvos.Ref. Fil. 1: 6; João 10: 28-29; I Ped. 1:5, 9. Esta perseverança dos santos não depende do livre arbítrio deles, mas da imutabilidade do decreto da eleição, procedente do livre e imutável amor de Deus Pai, da eficácia do mérito e intercessão de Jesus Cristo, da permanência do Espírito e da semente de Deus neles e da natureza do pacto da graça; de todas estas coisas vêm a sua certeza e infalibilidade. Ref. II Tim. 2:19; Jer. 31:3; João 17:11, 24; Heb 7:25; Luc. 22:32; Rom. 8:33, 34, 38-39; João 14:16-17; I João 2:27 e 3:9; Jer. 32:40; II Tess. 3:3; I João 2:19; João 10:28. (WESTMISNTER, 1999. p.16)

Spencer, comentando sobre esse assunto, afirma: “Sim, os santos perseverarão porque o Salvador declara que quer perseverar em favor deles, e quer guardá-los [...]. A perseverança dos santos depende da graça irresistível que nos é assegurada porque Cristo morreu por nós, uma vez que a expiação que temos, pelo seu sangue, é limitada aos eleitos”. (SPENCER, 1992. p.61).
3.6 Conclusão

As palavras de Charles Spurgeon, pastor Batista e um dos maiores entusiastas da doutrina calvinista, ecoarão melhor que quaisquer outras nesse momento conclusivo:

As velhas verdades que Calvino pregou, que Agostinho pregou, que Paulo são as verdades que eu devo pregar hoje, ou, de outro modo, serei falso à minha consciência e ao meu Deus. Eu não posso fabricar a verdade. Eu nada sei a respeito de como abrandar as ásperas arestas de uma doutrina. O Evangelho de João Knox é o meu evangelho. Aquele Evangelho que ribombou através da Escócia deve ribombar através da Inglaterra outra vez [...].Deleito-me em proclamar estas velhas e fortes doutrinas apelidadas de Calvinismo, porque são certa e seguramente a verdade revelada por Deus, como ela está em Jesus Cristo. (SPENCER, 1992, p.8).





[1] A história da cidade está associada à história da Reforma Protestante. Genebra ganhou o cognome de "Roma protestante" ou "a cidade de Calvino". A partir de 1536, a história da cidade de Genebra passa a estar associada com a história da Reforma Protestante. O líder protestante francês João Calvino instalou-se em Genebra pela primeira vez em 1536 e definitivamente em 1541. Calvino faleceu em Genebra em 1564.
[2] Frase muito citada do filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900). Aparece pela primeira vez em A gaia ciência, na seção 108 (Novas lutas), na seção 125 (O louco) e uma terceira vez na secção 343 (Sentido da nossa alegria). Uma outra instância da frase, e a principal responsável pela sua popularidade, aparece na principal obra de Nietzsche, Assim falava Zaratustra: Deus está morto! Deus permanece morto! E quem o matou fomos nós! ! Como haveremos de nos consolar, nós os algozes dos algozes? O que o mundo possuiu, até agora, de mais sagrado e mais poderoso sucumbiu exangue aos golpes das nossas lâminas. Quem nos limpará desse sangue? Qual a água que nos lavará? Que solenidades de desagravo, que jogos sagrados haveremos de inventar? A grandiosidade deste acto não será demasiada para nós? Não teremos de nos tornar nós próprios deuses, para parecermos apenas dignos dele? Nunca existiu acto mais grandioso, e, quem quer que nasça depois de nós, passará a fazer parte, mercê deste ato, de uma história superior a toda história até hoje! NIETZSCHE. Fredrich. A Gaia Ciência, §125.

quinta-feira, 21 de maio de 2009

A SOLUÇÃO PARA O PROBLEMA DA SAÚDE PÚBLICA

Todos são iguais perante a lei (Art.5º da CF). Essa é uma afirmação que tem ficado obsoleta. Cadavez mais assistimos a fragmentação de um Estado que não tem condições de assegurar, sequer, os direitos elementares dos cidadãos: saúde, educação e segurança (conforme prevê o Art.6º da CF: "são direitos sociais a Educação, a Saúde [...] a Segurança). Vivemos num estado democrático de direito, o que significa que fizemos um "acordo" com esse Estado. Abrimos mão de prover os meios de nossa própria segurança, educação e saúde (a priori de nossa inteira competência) e confiamos ao Estado a responsabilidade de viabilizar a satisfação dessas necessidades basilares, de tal forma que não temos mais o direito (ideologicamente) de andar armados para fazermos nossa própria proteção. Em contrapartida, nos comprometemos a pagar impostos, como forma de retro-alimentação desse Estado. Um contrato, de fato, com cláusulas a serem cumpridas pelas partes. A grande questão é: nós temos cumprido nossa parte e o Estado? Obviamente que não. Temos que, além dos impostos, pagar escola para nossos filhos; além dos impostos, temos que investir em segurança privada, grades, seguros, etc. Temos que, além dos impostos, pagar plano de saúde. Será que já não está na hora de rever esse modelo? Algo precisa ser feito, o Estado precisa ser denunciado ao “Procon”, por quebra de contrato; o que não adiantará muito, pois ele é o “Estado”. Reconhecemos, entretanto, a complexidade envolvida nesse assunto e claro que não conseguiremos esgotá-lo nessas breves linhas. Porém, gostaríamos de propor uma solução simples, barata e viável para um dos maiores problemas do Estado, e, conseqüentemente, nosso: a questão da saúde pública. Todos nós estamos acompanhando os problemas de saúde da ministra Dilma e do Vice-Presidente José Alencar. Ambos lutam contra o câncer, mas essa não é a única coincidência. Ambos só fazem seus caríssimos tratamentos nos melhores hospitais do pais (Instituto do Coração e hospital Sírio-Libanês). Eles (os políticos) não usam o SUS. Eis o diagnóstico das causas da falência e ineficiência do Estado, nesse quesito. Fica então a sugestão, caros legisladores: "que todos que ocupam cargos públicos sejam “obrigados” a utilizarem tão somente a rede pública de serviços, inclusive o SUS". Pronto! Resolvido o problema. Finalmente teremos ótimo atendimento nos hospitais, nunca mais faltarão medicamentos e, de quebra, nossos filhos estudarão em escolas de primeiro mundo. Alguém duvida?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

PRA QUÊ TABUADA SE TENHO DEDOS?

Acho muito engraçado quando vejo algumas mães, orgulhosas pelo progresso de seus filhos, passando outras companheiras de maternidade para trás. É algo mais ou menos assim: “... pois o meu filho já sabe fazer a, e, i, o, u ... Beto (filho “burrinho” da mãe humilhada) ainda não sabe?”. Outra mãe coruja suspira: “pois minha menina já sabe até tirar do quadro”. E quando o assunto é matemática? Ver a intimidade dos filhotes com os números é algo que requer a perda de qualquer resquício de modéstia: “Meu filho é muito inteligente... tu acreditas que ele já sabe fazer de 1 até 100 sozinho?”. E o meu? - Retruca a outra mãe -, na tentativa de dar a volta por cima: “pode perguntar a tabuada de 2 que ele sabe todinha (a essa altura já chama o filho, coloca-o na roda, e aí já viu...2x1...2x2..etc. E se o gênio errar? “Tá envergonhado!” - a solução está na ponta da língua). Situações como essas, ao contrário do que possa parecer - comentários simplórios - são bastante sintomáticas. Não importa se a criança ainda não tem maturidade cognitiva para compreender a abstração da matemática; não importa se as letras ou a tabuada ainda não fazem para ela o menor sentido e que as repetem apenas como um “papagaio” também repetiria. O que não dizer do sistema de notas? O que é mais importante: a nota ou o que efetivamente aprendemos? Certa vez fiz a seguinte experiência com um grupo de alunas da cadeira de filosofia da educação: após a avaliação, no dia da entrega das notas, comecei perguntando se elas consideravam que o trabalho durante o semestre havia sido produtivo, se haviam aprendido algo, incorporado novos conhecimentos. Para minha satisfação, ouvi comentários muito positivos sobre os trabalhos realizados. A alegria era geral e só parou –brusca e repentinamente – quando comecei a entregar as notas: 1,5; 3,0; 2,5 e até um 4,0. Entreguei a última nota e comecei a anotar no quadro o próximo assunto a ser estudado. Não consegui prosseguir com a aula tal era o grau de perplexidade. Houve quem demonstrasse acintosa insatisfação e quem não parava de rir, pela nota patética. Claro que as notas eram fictícias, mas a reação deixou muito evidente o que já sabemos: estudamos para tirar boas notas e não para aprender. Tanto é assim que ninguém – nem professores, nem alunos, nem diretores, nem pais – está preocupado com as questões erradas. Será que o que o aluno errou na prova também não era importante? Mas quem liga, se o objetivo é “apenas” atingir a média? Estudamos para obter o diploma e não os “conhecimentos puros” (desprovidos de outros objetivos). E se a faculdade não pudesse, por algum motivo, diplomar? Algum aluno permaneceria pelo “amor ao saber”? Vivemos a geração da “plataforma Windows” na educação, isto é, o usuário sabe apenas clicar, mas não conhece os processos internos; não sabe como os comandos são executados, diferentemente da geração MSDOS (que sabe exatamente o que há por trás do clique, além de também saber clicar). Neste sentido, contar nos dedos porque “ainda” não decorou a tabuada é um excelente sinal. É o próprio aluno construindo, ativamente, seu conhecimento. Isso é uma prova inconteste que ele sabe executar os comandos e não apenas clicar no botão resultado. Em última análise, se seu filho conta nos dedos ao fazer alguma operação matemática, fique feliz!

segunda-feira, 11 de maio de 2009

A IMPORTÂNCIA DA FILOSOFIA PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA RELIGIOSIDADE SADIA


O texto a seguir trata-se de um discurso proferido - pelo autor - na cerimônia religiosa da formatura de Licenciatura em Filosofia, na capela da Universidade Católica de PE, em 12/12/2003, onde foi graduado.


Como estamos em uma cerimônia religiosa, julguei ser oportuno refletirmos por alguns minutos sobre a importância da filosofia na produção de uma fé sadia e de uma teologia coerente. Geralmente se diz dos filósofos que são ateus e que a filosofia afasta o homem de Deus. Mas, o papel fundamental da filosofia é buscar e encontrar a verdade, esteja onde estiver. A filosofia não é um fim em si mesmo, mas um canal de investigação da verdade; de forma que é verdadeira a velha máxima: “A filosofia é a mãe de todas as ciências”. A expressão paulina já nos convida a “prestar um culto racional”. Diz ele: “apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso “culto Racional”. É evidente, caros colegas, caros ouvintes, que nossa religiosidade e até nossa fé devem ter um “parâmetro racional”, sob pena de tomarmos veneno para obedecer ao mandamento de desajustados líderes religiosos, mas não tão desajustados a ponto de ingerirem, eles próprios, o líquido letal. Sob pena também de acreditarmos que uma simples fenda numa rocha, causada pela ação erosiva do tempo, em um longínquo interior nordestino tenha sido causada pelas mães de Jesus Cristo, quando carregava a cruz que nos pertencia, só porque os “tutores de nossa fé” querem que acreditemos em tamanho homicídio histórico e geográfico. Poderíamos aqui também lembrar-nos de alguns expoentes da filosofia que nutriam algum tipo de religiosidade, a exemplo de Agostinho de Hipona, Tomas de Aquino, Kant, Descartes e tantos outros. Caros colegas filósofos, vivemos num contexto nunca visto antes. Precisamos dar nossa contribuição em perseguimos à verdade, com zelo, até encontrá-la, esteja onde estiver, e fazê-la vir à tona. A filosofia é, antes, um instrumento a serviço da produção de uma religiosidade sadia.

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