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sábado, 1 de agosto de 2009

A FILOSOFIA DO TEMPO E OS 150 ANOS DA IPB

A igreja presbiteriana do Brasil comemorou, no último dia 12/08/09, 150 anos de existência em solo nacional. Seria uma data qualquer, caso sua história não provocasse admiração e respeito dos mais diversos seguimentos da sociedade. A comemoração dessa data, como foi feita, marca um “divisor de águas”, em meio à turbulenta e turvada história do evangelicalismo brasileiro contemporâneo, responsável direto pela onda de desconfiança instaurada no inconsciente coletivo; uma “crise da religiosidade evangélica”, de fato. Foram inúmeros os discursos de reconhecimento da seriedade da IPB, durante a comemoração, que se estendeu por todo o país. O presidente Lula, que participou de um ato cívico religioso, na Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro, fez a seguinte afirmação: “A determinação e a fé de vocês e de todos os seus antecessores transformaram a igreja Presbiteriana em uma das igrejas mais importantes do Brasil. A semente lançada pelo missionário Simonton germinou em nossa terra. Por isso quero dar os parabéns à Igreja Presbiteriana pelos seus 150 anos”, conforme: http://www.igeva.com.br/. O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, que também esteve presente ao ato, fez questão de ressaltar a seriedade da IPB. Disse ele: “Se há algo que marca a Igreja Presbiteriana é a reputação de seus líderes, é a seriedade com que eles conduzem a palavra da fé sem o usufruto dessa palavra para diminuir o ser humano”, conforme: http://www.imprensa.rj.gov.br/. O jornal Nacional, da Rede Globo, também noticiou a presença do Presidente Lula e outras autoridades nos 150 anos da IPB:

Esses testemunhos, externos à IPB, são importantíssimos e demonstram, de forma inequívoca, que nem todas as igrejas, pastores e líderes religiosos são, como se diz no adágio popular, “farinha do mesmo saco”. O que chama a atenção, em todos esses discursos, é o reconhecimento que essa visível seriedade da IPB, não é algo apenas “de momento”; antes, é algo que faz parte de sua própria constituição, desde sua fundação até aos dias de hoje. Isso, certamente, ocorre por seu apego às Sagradas Escrituras, interpretando-a por meio de seu arcabouço doutrinário, costumeiramente apelidado de Calvinismo, o que a distancia, cada vez mais, do misticismo infrutífero que acomete muitas denominações evangélicas do Brasil. Isso também explica porque Max Weber, em sua famosa obra (considerada a obra de não ficção mais importante do século XX) “Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, pôde fazer a seguinte constatação: “O Deus de Calvino exigia de seus crentes não boas ações isoladas, mas uma vida de boas ações combinadas em um sistema unificado” (WEBER, 2002. p.91). Chegar aos 150 anos dessa forma – “contando com a simpatia de todo o povo” (Atos 2:47) – é algo realmente digno de ser pontuado. Aproveite e conheça um pouco mais sobre a IPB, num vídeo produzido pelo Observatório das Religiões, da Universidade Católica de Pernambuco:

Cabe aqui, inclusive, uma breve reflexão filosófica acerca do tempo, uma vez que é dele que estamos tratando, em última análise. Qual a leitura que podemos fazer da IPB, em relação a todo esse tempo de existência? Porque a IPB é o que é hoje e não outra coisa? O que é, afinal, o tempo? O que significa ter completado 150 anos? Que poder tem ele de transformar ou, antes, de conservar uma instituição? O filósofo medieval Agostinho de Hipona, uma das maiores autoridades do assunto, reconhece a dificuldade envolta a esse difícil enigma da humanidade: “Que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o tempo? Quando dele falamos compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam”[1]. Entretanto, Agostinho reconhece também que essa facilidade é apenas aparente e afirma: “Se ninguém me perguntar, eu sei; porém se quiser explicar a quem me perguntou, já não sei”[2]. Apesar da dificuldade em entender o tempo e, exatamente por “reconhecer que nada sabe”, o filósofo vai em busca das respostas às suas próprias indagações e diz: “Pai, eu busco, não afirmo. Ó Deus, vigia os meus passos e guia-me. Quem se atreveria a dizer-me que não há três tempos – conforme aprendemos na infância e ensinamos às crianças, isto é, o passado, o presente e o futuro? [3]. Seria o tempo realmente um amontoado de instantes justapostos, homogêneos entre si e que não causam nenhum enriquecimento ou empobrecimento ao instante imediatamente posterior, como quer a ciência, no seu tempo “medido” pelo relógio? Seria o tempo momentos completamente distintos entre si, dividido entre passado, presente e futuro? O tempo, segundo o filósofo francês Henri Bergson, não está ligado à quantidade e sim à qualidade. A IPB não se tornou o que é hoje – uma instituição respeitada, para a glória de Deus – “de uma hora para outra”, antes, ao contrário, é hoje a soma de tudo que viveu ao longo dos seus 150 anos de história. Cada momento, cada instante foi sendo acrescido em sua construção – “Edifício de Deus sois vós” (I Cor 3:9), já lembrava o apóstolo -; nenhum deles se perdeu, “nenhum deles acaba ou começa, mas todos se prolongam uns nos outros. É, se quiser, o desenrolar de um novelo. Mas é, da mesma maneira, um enrolar-se contínuo, como o de um fio numa bola, pois nosso passado nos segue, cresce sem cessar a cada presente que incorpora em seu caminho [...] pois o momento seguinte contém sempre, além do precedente, a lembrança que este lhe deixou[4]. Momentos bons e momentos maus, de união e também de separação; todos eles contribuíram para a formatação da IPB que conhecemos hoje. Mas, há, entretanto, uma espécie de “élan vital” - algo que é responsável por promover as mudanças – necessárias, naturais e inevitáveis -, ao longo da história e, ao mesmo tempo, preservar o que há de essencial - para que não haja uma descaracterização dos princípios basilares, a ponto de tornar-se outra instituição. Essa espécie de fio condutor, que preserva o que é essencial em meio às mudanças, que são próprias do tempo, são os seus símbolos de fé: Confissão de Fé de Westminster, Catecimos Maior e Breve Catecismo de Westminter, que nada mais são que “a fiel exposição e interpretação das Sagradas Escrituras". Há aqueles, porém, dentro da IPB, que insistem em negar-lhes o valor, afirmando ingenuamente: “não quero saber desses livros e sim da bíblia”. Afirmação – apenas - travestida de espiritualidade, mas completamente isenta da lógica mais elementar. Abrem a boca, esses mesmos, entretanto, para opinar sobre as escrituras, para pregar sobre as escrituras. Ora, o que é isso senão uma “livre interpretação”? Qual das interpretações tem mais possibilidade de êxito? Essas ou as produzidas por cerca de 121 dos melhores teólogos que a história já conheceu, por longos e calorosos sete meses? Esse é um assunto fundamental e que dirá o que será a IPB nos próximos 150 anos. Pensemos um pouco sobre o futuro, cuja previsão é uma impossibilidade filosófica. Ele – o futuro – não está esperando, em algum lugar, para revelar-se no seu momento oportuno. Antes, ele nada será além da nossa construção, durante o tempo da nossa “duração”. Em 2.159 (caso não venha o Senhor, nesse interregno – Maranatha) o que será a IPB? Ou seria mais ideal perguntar-nos: ainda será a IPB? Ou, ao contrário, ter-se-á transformado em outra instituição? Somente a confessionalidade garantirá a existência de uma verdadeira Igreja Presbiteriana do Brasil, no futuro, como tem sido até aqui, mesmo em meio às dificuldades inerentes e impostas por um país continental, cuja diversidade cultural impressiona o mundo. Ensinemos pois, às futuras gerações, o que é ser presbiteriano, para que o esforço de muitos presbiterianos, do passado, desde Simonton, perpassando por nossa geração, não tenha sido em vão.


[1] AGOSTINHO. Confissões. 9. ed. Trad. de J. Oliveira Santos e A. Ambrósio de Pina. Petrópolis: Vozes, 1988, XI 14,17.
[2] Ibid., XI 14,17
[3] AGOSTINHO. Confissões. 9. ed. Trad. de J. Oliveira Santos e A. Ambrósio de Pina. Petrópolis: Vozes, 1988, XI.21, 17.
[4] BERGSON, Henri. Introdução à metafísica. Trad. De Franklin Leopoldo. São Paulo: Abril cultural, 1979, p. 16.

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