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quinta-feira, 17 de setembro de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 6/11


A segunda controvérsia contra os Maniqueus: O Problema do Mal. Cont.

Esta questão da origem do mal afligiu o coração de Agostinho e foi uma das razões que o fez enveredar pelo caminho maniqueu, pois acreditava ter encontrado nesta seita uma resposta que pudesse ao mesmo tempo explicar a origem do mal e isentar Deus de tal culpa. O prof.Drº Marcos Roberto Nunes Costa, em sua importante obra “O Problema do Mal na Polêmica Antimaniqueia de Santo Agostinho”, clarifica isso. Diz ele:


Os maniqueus, e agostinho, durante o tempo em que pertenceu a essa seita, estavam preocupados em  responder a uma simples pergunta: como é possível conciliar as maldades presentes no mundo – as injustiças, as desgraças, os ódios, as pestes, as calamidades, as misérias dos homens, os defeitos das sociedades e muitas outras com a bondade de Deus? Ou seja, Deus, O Bem, pode ser causa do mal? Ou devemos atribuir a outro ser tão poderoso quanto Ele a causa do mal? Tentando responder a tal dilema, os maniqueus vão construir uma doutrina que isenta Deus de toda responsabilidade pelos males existentes no universo e o homem pelas maldades praticadas individualmente[1].

O próprio Agostinho quando esteve como ouvinte entre os maniqueus concordava e de certa forma nutria a idéia da possibilidade do mal ter sido criado por outra divindade. Diz ele:

Certa religiosidade que possuía me obrigava a crer que um deus bom não podia ter criado uma natureza má [...], me parecia mais justo crer que não tivesses criado  mal nenhum, do que acreditar que a natureza do mal – como eu a imaginava – proviesse de ti[2].

Por fim, reconhece que “desse princípio peçonhento derivam todos os outras idéias errôneas”[3]. Afastado do Maniqueísmo ele agora entende o erro deles com relação à criação de todas as coisas, como afirma:

Com  atenção procurei saber se por sete ou oito vezes viste que as tuas obras eram boas, quando te agradaram. Mas não encontrei uma seqüência de tempo, enquanto contemplavas, pela qual pudesse deduzir quantas vezes contemplaste tuas criaturas. E eu disse: “Senhor, por acaso não será verdadeira a tua Escritura, ditada que foi por ti, que és verdadeiro ou melhor, que és a própria verdade? E porque então me dizes que a visão dos seres criados não está sujeita ao tempo, quando a tua Escritura me afirma que dia por dia estavas vendo que as tuas obras eram boas, e que eu, contando, encontrei o número de vezes que as contemplastes? A esta minha pergunta, respondes que tu és o meu Deus e dizes, falando com voz poderosa ao ouvido interior do teu servo, respondendo-lhe a surdez e clamando: “Homem, o que a minha Escritura diz, eu o digo. Mas ela o diz no tempo, e este não atinge o meu verbo, que subsiste comigo numa eternidade igual à minha. Assim o que vedes através do meu espírito, sou eu que vejo; o que dizeis pelo meu espírito, sou eu que digo. Mas, o que vedes no tempo, eu não vejo no tempo; assim também o que dizeis no tempo, eu não o digo no tempo[4].            

E ainda,

Escutei, Senhor meu Deus, e consegui recolher uma doce gota da tua verdade. Compreendi que a alguns desagradam as tuas obras. Sustentam que muitas delas criaste impelido pela necessidade; assim por exemplo, a estrutura dos céus e o sistema dos astros. Dizem que essas não foram criadas por ti, mas que já existiam, provindas de outra fonte. Tu as terias apenas reunido, compondo-as e coordenando-as, quando edificaste as muralhas do mundo, depois de teres vencido os teus inimigos, para que cativos, nessa construção, não pudessem de novo rebelar-se contra ti. Quanto aos outros seres, não os terias criado nem ao menos ordenado; assim por exemplo os corpos carnais, os animais menores e tudo o que se radica na terra; teria sido um espírito hostil e uma natureza não criada por ti e oposta à tua; quem teria gerado e formado tais seres nas regiões inferiores do universo. São loucos os que assim falam porque não vêem as tuas obras através do teu espírito; nem nelas te reconhecem[5].
            
Em relação à origem do mal, Agostinho tentou convencer os maniqueus que a existência de qualquer coisa que seja, no céu, no mar, no ar ou na terra, é criação de Deus; no caso do mal, por ser criatura, foi Deus também que criou, contudo, não podendo ser responsabilizado moralmente por sua utilização.

A clareza em relação à criação de tudo e de todas as coisas inundou a mente de Agostinho fazendo-o corrigir seu antigo erro e ao mesmo tempo entender que tudo é perfeito e todas as coisas existem para determinados fins, como partes integrantes de um grande projeto.

Agostinho chega a esta conclusão já no final de suas “Confissões”, como reconhece:

“No Espírito Santo nós vemos que é bom tudo o que de algum modo existe, porque precede, não de quem existe em certo grau, mas daquele que é por essência”[6].

Assim sendo, Agostinho mais uma vez reafirma a eternidade e o poder criacional de Deus.

Evidentemente que esse tema – a origem do mal – precisa de um trabalho especificamente sobre ele. Há muitas outras questões a serem abordadas, como por exemplo, o tratamento que Agostinho dá a essa questão na sua obra “Livre Arbítrio”, onde parece intentar uma “defesa” de Deus, em relação a suposta criação do mal. Sobre essa obra, vale salientar que foi revisitada e repaginada por Agostinho, no que diz respeito a muitos assuntos ali abordados, inclusive o “Livre-Arbítrio”, mudando radicalmente sua posição inicial, como pode ser visto em sua última obra “A Graça”. Outro tema a ser pensado dentro desse assunto é a influência de Plotino na formulação do conceito de mal de Agostinho. Sendo ele – Plotino – um neoplatônico, entendia o mal como sendo o distanciamento ou a ausência do Sumo Bem e não um ente. Todas essas são facetas desse difícil tema – O problema do mal – que precisam ser aprofundadas. Aqui, porém, não é nosso objetivo principal, visto que o que nos interessa é a questão da eternidade.



[1] COSTA, Marcos Roberto Nunes. O problema do mal na polêmica antimaniquéia. Porto Alegre: Edipuc, 2002, p.58,59.
[2] Conf., V.10,20
[3] Ibid.,V.10,20
[4] Ibid., XIII, 29,44
[5] Conf., XIII, 30, 45
[6] Ibid., XIII, 31,46

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 5/11


A segunda controvérsia contra os Maniqueus: O Problema do Mal .


A primeira controvérsia nos conduz, necessariamente, a outra controvérsia entre  Agostinho e os mesmos maniqueus: a questão da origem do mal, que abordaremos apenas rapidamente.

Sendo Deus criador de todas as coisas teria ele também criado o mal? Apesar de ser este um grave problema, considerado como um dos mais profundos, tanto para a Teologia quanto para a Filosofia, não nos deteremos demoradamente nele, pois nossa intenção é demonstrar a eternidade em Agostinho, como já o fizemos  na controvérsia sobre a eternidade de Deus, e o faremos ainda quando tratarmos da controvérsia contra os pelagianos, sempre objetivando a eternidade. Contudo, vale salientar que:

Este mal era explicado de várias maneiras. Kant o considerava como uma coisa pertencente à esfera super-racional, que ele confessa não ter condições de explicar. Para Leibnitz, devia-se às necessárias limitações do universo. Scheiermacher via sua origem na natureza sentimental do homem e Ritsche na ignorância do homem, ao passo que os evolucionistas o atribui à oposição das propensões inferiores à consciência moral em seu desenvolvimento gradativo [...]. De algum modo, o mal do homem está ligado à sua condição de criatura[1].

A “confissão de Westminster”, um importante documento Agostiniano, em certo sentido, via calvinismo, afirma o seguinte sobre a origem de todas as coisas, em seu capítulo III, que trata sobre os eternos decretos de Deus:

Desde toda eternidade, e pelo sapientíssimo e santíssimo conselho de sua própria vontade, Deus ordenou livre e imutavelmente tudo quanto acontece. Embora Deus saiba tudo quanto há de suceder em todas as circunstâncias imagináveis, contudo não decretou coisa alguma por havê-la previsto como futuras, nem como algo que haveria de acontecer em tais circunstâncias[2].

Assim como Agostinho, e não poderia deixar de ser, devido sua clara influência nas mentes de calvinistas e luteranos, os formuladores dessa Confissão, de fato, criam que as coisas existentes, não eternas, todas elas, sem exceção, foram criadas por Deus; não simplesmente porque previu seu surgimento, antes, por decreto as criou, independentemente, repetimos, de juízos de valores, é criatura? Conseqüentemente e necessariamente, foi Deus quem criou.

No capítulo VI deste mesmo documento agostiniano/calvinista, vemos uma afirmação ainda mais contundente e surpreendente sobre a criação de Deus, e, desta feita, não de uma criação geral, mas da criação do próprio mal ou antes, na ordenação de sua disposição: 

“Nossos primeiros pais [...] pecaram [...]. Segundo seu sábio e santo conselho, aprouve a Deus permitir o pecado deles, havendo proposto ordená-lo para sua própria glória”[3].

Berkhof, interpretando os eternos decretos de Deus, apontados acima, sendo também um pensador de linha calvinista, e, conseqüentemente, muito próximo do pensamento agostiniano, faz a seguinte afirmação: “O decreto eterno de Deus evidentemente deu a certeza da entrada do mal no mundo, mas não se pode interpretar isso de modo que faça Deus a causa do mal no sentido de ser ele o seu autor responsável”[4]. Continua...


[1] BERKHOF, 1998, p.221
[2] WESTMINSTER, confissão. São Paulo: Ed.Cultura Cristã, 1996, p.5
[3] WESTMINSTER, 1996, p.7
[4] BERKHOF, 1998, p.221

sábado, 12 de setembro de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 4/11


A primeira controvérsia contra os Maniqueus: O que fazia Deus antes de Criar a Terra? Cont.

Nem mesmo em suas eternas palavras há sombra de mudanças ou variação, do contrario onde estaria o conselho eterno? Em Deus, devido sua eternidade não se pode pensar na linguagem assim como em nós ocorre: sucessivamente e depois do pensamento. Tudo, pensamento, palavras e frases acontece ao mesmo tempo. Os tipos de antropormofismo por vezes nos dão uma falsa impressão de secessão em suas palavras e atos, porém como o entenderíamos nós, pelo menos em fagulhas, se não utilizássemos esse recurso de dizer as coisas concernentes a Deus através das coisas que conseguimos entender?

Pois o que  foi dito não foi sucessivamente proferido – uma coisa concluída para que a seguinte pudesse ser dita, mas todas as coisas proferidas simultânea e eternamente. Se assim não fosse, já haveria tempo e mudança, e não verdadeira eternidade e verdadeira imortalidade[1].
                        
O que fazia Deus antes de criar o mundo?

“Aqueles que falam assim, ainda não te compreenderam [...]; ainda não compreenderam como se fazem as coisas criadas por ti e em ti”[2]. Em Deus não há devir, apenas ser. “Na eternidade nada passa, tudo é presente, ao passo que o tempo nunca é todo presente”[3].

Com esse desvinculamento do tempo perguntado pelos maniqueus e a eternidade divina, Agostinho esvazia seus argumentos, a ponto de responder, supostamente não respondendo, que antes da criação “Deus preparava o inferno para aqueles que perguntam estes profundos mistérios”[4].

Com essa séria construção lógica, confrontando o tempo perguntado pelos maniqueus com a eternidade de Deus, Agostinho põe por terra toda cadeia argumentativa do mito maniqueu, de uma criação co-eterna e assim sendo, sem um criador. Põe abaixo também a dualidade maniquéia da existência também co-eterna de duas forças incriadas, o bem e o mal e empunhando a bandeira, lógica e racional, não apenas mística, de que todas as coisas, por sua natureza, quer direta ou indiretamente, são criaturas de Deus, independentemente de seus juízos de valores.

Agostinho afirma um Deus eterno e uma criação não eterna, por sua própria natureza, e que todas as coisas foram criadas por Deus, quer direta ou indiretamente e que não cabe a pergunta: “o que Deus fazia antes”, pois, antes da criação, não havia tempo, nem homem, para que se possa utilizar o termo “antes”, nem criação, apenas Deus em seu atributo incomunicável de imutabilidade, em sua eternidade:

Porventura Senhor, tu és eterno, já não conheces o que te digo? Não vês no tempo o que se passa no tempo? Por que motivo te narro então tantos acontecimentos? Não é, certamente, para que os conheças por mim, mas para despertar meu amor por ti[5].

A partir desse conceito de eternidade e em contraponto com ele, Agostinho desenvolve, de forma mais elaborada, sua teoria sobre o tempo, abordando entre outros aspectos, a subjetividade do tempo, no  desenvolvimento da noção de passado, presente e futuro, perpassando também pelo primado do presente, que é, como vimos, uma janela para a eternidade, que é um presente que não passa.

A primeira controvérsia de Agostinho com os maniqueus - sobre o que Deus fazia antes de criar o mundo – levou-o a afirmar a eternidade de Deus e assim procedendo, inegavelmente, admite a possibilidade de um “tempo” para além-do-tempo; o faz entretanto, buscando apoio nas revelações, não diminuindo por isto, de forma alguma, o valor lógico e racional de seus argumentos. Fica evidente de igual modo que Deus sendo eterno – Ele sozinho – sem ninguém com quem tome conselho - é também livre para criar; e o que criou, criou segundo sua exclusiva, soberana e eterna vontade:

Tuas obras te louvam para que te amemos e nós te amamos, para que tuas obras te louvem, elas que tiveram início e fim no tempo, nascimento e morte, progresso e regresso, beleza e imperfeição. Todas elas têm sucessivamente manhã e tarde, ora oculta ora manifesta. Do nada foram criadas por ti, não da tua substância; não de alguma matéria não tua que existisse antes, mas de matéria concreta, criada por ti ao mesmo tempo que lhe deste uma forma sem nenhum intervalo de tempo. Uma é a matéria do céu e da terra. Essa matéria foi tirada da matéria informe, mas essas duas operações foram simultâneas, de forma que entre a forma e a matéria não houve intervalo de tempo[6].

A possibilidade da eternidade está intimamente ligada com a questão da imutabilidade. Para Agostinho, Deus é um eterno “Ser”, que não muda, que não possui sequer sombra de variação; mais que isso, ele é único sob essas condições:

A imutabilidade de Deus é necessariamente concomitante com sua asseidade. É a perfeição pela qual não há mudança nele, não somente em seu Ser, mas também em suas perfeições, em seus propósitos e em suas promessas. Em virtude deste atributo ele é exaltado acima de tudo quanto há, e é imune de todo acréscimo ou diminuição e de todo desenvolvimento ou decadência em seu Ser e em suas Perfeições [...] Até a razão nos ensina que não é possível nenhuma mudança em Deus, visto que qualquer mudança é para melhor ou para pior. Mas em Deus, a perfeição absoluta, melhoramento e deterioração são igualmente impossíveis[7].











[1] Conf., XI. 7, 9
[2] Conf.,XI.10.11
[3] Ibid.,XI.10.11
[4] Ibid.,XI.10.12
[5] Ibid. XI.1.1
[6] Conf., XIII, 33, 48
[7] BERKHOF, 1998, p.61

sábado, 5 de setembro de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 3/11


A primeira controvérsia contra os Maniqueus: O que fazia Deus antes de Criar a terra?

Mas o cerne das principais polêmicas entre Agostinho e os Maniqueus, e a que nos interessa aqui de forma mais direta, foi o embate sobre a pergunta acerca do que fazia Deus antes de criar a terra. Ele apresenta a argumentação maniqueia da seguinte forma:

Certamente estão ainda mergulhados na cegueira do velho homem aqueles que dizem: que fazia Deus antes de criar o céu e a terra? E acrescentam: se estava ocioso e nada realizava, porque não ficou sempre assim, continuando a abster-se do trabalho? Se existia em Deus um movimento novo, uma vontade nova de criar uma criatura que ele ainda não tinha feito antes, como se pode falar de verdadeira eternidade, onde nasce uma vontade que antes não existia? Mas a vontade de Deus não é uma criatura; é anterior a toda criatura, pois nada seria criado se antes não existisse a vontade do criador. Essa vontade pertence a própria substância de Deus. Mas se algo surgiu na substância de Deus que antes não existia, não é justo denomina-la substância eterna. Pelo contrário, se era eterna a vontade de Deus que existisse a criatura, porque não é eterna também a criatura?[1].

Fica claro a intenção dos maniqueus, que usando o método socrático-argumentativo, tentam deixar Agostinho em situação embaraçosa entre duas encruzilhadas não gratas: se reconhece a mudança na vontade de Deus caí no precipício de negar-lhe a eternidade; se por outro lado admite a existência co-eterna das coisas admite integralmente o pensamento dos maniqueus. 

Para responder aos questionamentos sugestionadores dos maniqueus, Agostinho, cautelosamente, leva a indagação para um outro norte, procurando estabelecer parâmetros para sua resposta e ao mesmo tempo esvaziar a pergunta dos maniqueus, uma vez que para Deus não há passado nem futuro, mas apenas um eterno presente, isto é, Deus tudo vê, de forma compacta e ao mesmo tempo, no “esplendor de sua sempre imutável eternidade”. Agostinho reconhece o esforço deles para conhecer as coisas eternas, mas adverte: nunca conseguirão chegar a esta compreensão; pelo menos enquanto não se desvencilharem das realidades passadas e futuras.

Para Agostinho, não cabe sequer a pergunta sobre o que Deus fazia antes da criação ou ainda, porque não quis criar antes o que criou depois?  Essas questões pressupõem mudança e mudança é antítese de eternidade:

A imutabilidade de Deus é necessariamente concomitante com sua  esseidade. É a perfeição pela qual não há mudança nele, não somente em seu ser, mas também em suas perfeições e em seus propósitos e em suas promessas. Em virtude deste atributo ele é exaltado acima de tudo quanto há, e é imune de todo acréscimo ou diminuição e de todo desenvolvimento  ou decadência em Seu Ser e em suas perfeições [...]. Até a razão nos ensina que não é possível nenhuma mudança em Deus, visto que qualquer mudança é para melhor ou para pior. Mas em Deus, a perfeição absoluta, melhoramento ou  deterioração são igualmente impossíveis[2].

Eles – os maniqueus – estavam  querendo achar um Deus que em sua própria natureza é livre, por sua eternidade e soberania, preso aos mesmos caprichos de suas consciências. Estavam usando as lentes erradas, jamais compreenderiam que, em certo sentido, “o princípio” não o é em relação a Deus e sim em relação às criaturas. Todas as coisas foram criadas por Ele e para Ele. Em Deus não pode haver e não há movimentos, pois isto é próprio da criatura finita e não de criador infinito, como afirma agostinho:

O céu e a terra existem e, através de suas mudanças e variações, proclamam que foram criadas [...], e todas as coisas proclamam que não se fizeram por si mesmas: Existimos porque fomos criados; mas não existimos antes de existir, portanto não podíamos ter criado a nós mesmos[3].

Como poderia uma obra de arte existir antes da existência do seu criador? Se a pintura é contemplada e enche cada vez mais partes do corpo até ficar todo ele tomado de um sentimento estético indescritível, ela – a pintura – estará sempre proclamando que foi criada; até mesmo seu valor é avaliado não pela sua beleza em si e sim pela importância do seu criador; maior honra terá a obra em proclamar que é criatura e nunca se dirá co-existente com seu criador, do contrário não seria criatura e muito menos dirá ser a causa de sua própria existência e, ainda que possível fosse, já estaria denunciada sua falácia, numa simples contemplação.

Assim também é o sentimento da criação toda em relação ao seu criador, apenas com uma diferença: a tela produzida é posterior ao seu criador porém, este, por ser também criatura de um criador, só pode criar a partir de um outro corpo; ao contrário, a criação de Deus, afirma Agostinho em sua confissão e conversa com seu criador:

Certamente não fizestes como o artista, que se serve de um corpo para formar outro corpo, imprimindo-lhe segundo a inspiração do espírito, a imagem que seu olhar interior descobre [...] nem tinha à mão matéria alguma com que modelasses o céu e a terra [...] portanto, disseste uma palavra e as coisas foram feitas, com a tua palavra os criastes[4].
















[1] Conf.,XI.10.12
[2] BERKHOF. Louis. Teologia Sistemática. Campinas: Ed.Luz para o caminho,, 1998.p.61
[3] Conf., XI. 3. 4
[4] Conf.,  XI.3, 5

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 2/11


As duas controvérsias com os maniqueus

O Maniqueísmo foi uma espécie de seita  fundada por Mani, no século III. Ele acreditava que a difícil situação humana era causada por dois princípios que co-existem naturalmente em todos os seres humanos:  o primeiro espiritual e luminoso o segundo material, físico e tenebroso. Mani afirmava ainda que essa doutrina tinha sido revelada em diversas épocas a vários profetas, entre os quais estavam Buda, Zoroastro, Jesus, e por último, ele próprio.

O Maniqueísmo espalhou-se principalmente pela Pérsia, contemporaneamente Irã e por toda costa do Mediterrâneo.  Sua doutrina misturava as doutrinas de Zoroastro com o Cristianismo. Para efeito ilustrativo e com o objetivo de situar-nos exatamente nos primórdios da formação de Agostinho, até para facilitar o entendimento de seus argumentos acerca de assuntos como por exemplo, que trataremos mais adiante, da questão da eternidade: Basicamente a doutrina maniqueísta está fundamentada sob o pilar da existência de dois princípios antagônicos: o bem e o mal. O bem sendo representado por Deus e o mal por Satanás. Deus, para libertar a luz do cativeiro da matéria criou, por intermédio dos espíritos, inimigos dos demônios, o sol, a lua, os astros e a terra. E para salvar os homens enviou Cristo. Para ele, o Espírito Santo era menor que o filho. Com relação a Cristo, afirmava que, ao contrário dos demônios, Cristo tomou corpo apenas aparente e não real, isto posto, em virtude de sua compreensão negativa acerca do corpo, e por isso, conseqüentemente, sua morte não foi verdadeira; tendo sido uma espécie de teatro, de encenação. Ele dizia-se enviado por Deus para completar a obra de Cristo, chegando a ter, analogamente a Cristo, 12 ministros, numa clara tentativa de imitação do mistério de Cristo e de seu apostolado; além desses, tinha a frente um chefe, um homem chamado,  Fausto de Mileve e ainda  72 bispos, diáconos e presbíteros; era uma seita, no sentido organizacional, bem instituída. Celebravam missa sem vinho, festejavam o Domingo, sexta-feira santa e, principalmente, o dia de aniversário de Mani.

Tudo isso parecia ser uma resposta para as dúvidas de Agostinho, na juventude, antes da conversão, que basicamente caminhavam por duas direções: a primeira era com relação às Escrituras Cristãs, que considerava escritos rústicos, desprovidos de sutileza e elegância. A segunda era a questão da origem do mal; desde cedo sua mãe lhe havia ensinado que só havia um Deus. Mas Agostinho perguntava de onde vinha todo o mal se, como aprendera, Deus é bom e autor de tudo o que é bom. Nestes dos pontos especificamente as doutrinas do Maniqueísmo parecia, e somente aprecia, ter respostas que acalentassem aos anseios de Agostinho. Para o Maniqueísmo, as Escrituras não eram as palavras do princípio da luz, e o mal também não era produto deste princípio, mas o princípio das trevas; respostas que pareciam fazer sentido para Agostinho que durante nove anos - de 374 a 383 - foi, como ele mesmo afirma, um ouvinte das idéias maniqueístas. Ouvinte não simplesmente como sugere a palavra; existia entre os maniqueus uma gradação de proximidade e envolvimento com a seita: eram chamados de “eleitos” aqueles que se envolviam completamente com seus rituais e cerimônias, aqueles que cumpriam integralmente todas as suas exigências. Agostinho fazia parte da outra classe de maniqueus. Uma espécie de catecúmeno que não se obrigava a todos os votos exigidos pela seita, chamados de ouvintes.
Posteriormente, Agostinho foi um forte oponente das doutrinas maniqueístas, como afirma em sua confissão:

Meu entusiasmo pelos escritos dos maniqueus acabou. Pois se o mais famoso entre eles (Fausto, bispo maniqueu) mostra-se tão inepto para resolver as questões que me angustiam, que poderia esperar dos outros mestres? Todavia, mantive relacionamento com ele, baseado no grande interesse comum pela literatura, que eu, como professor, ensinava aos jovens de Catargo. Lia com ele as obras que ele desejava conhecer, e as que eu julgava adequadas à sua inteligência. De resto, depois de conhecê-lo, meu propósito de prosseguir naquela seita caiu por terra, mas não a ponto de separa-me totalmente dela. Não havendo, por assim dizer, nada melhor, decidi permanecer no ponto a que chegara, enquanto não aparecesse algo mais calmo, que merecesse ser abraçado. Dessa forma, aquele Fausto, que foi para muitos uma armadilha mortal, sem que soubesse, começou a afrouxar o laço que me prendia[1].




[1] Conf.,V,7.13

domingo, 23 de agosto de 2015

A QUESTÃO DA ETERNIDADE EM AGOSTINHO DE HIPONA – PARTE 1/11



A problemática do tempo tem sido motivo de intensos debates em diversas épocas. Como sabemos, essa questão traz inúmeras outras questões a serem resolvidas. Uma delas é a de tentar sincronizar o tempo geral das Matemáticas e das Ciências em relação ao tempo interno de cada indivíduo. Contudo, um dos maiores e mais polêmicos dos problemas trazidos pela reflexão acerca do tempo é o que  trata da transição de um tempo vivenciado em vida para o além-vida-corpo: a eternidade. São muitas as tentativas de  apreender esta espécie de negação do tempo enquanto sucessão e ao mesmo tempo esse prolongamento de um presente que não passa. Em seu livro “História da Eternidade”, Jorge Luis Borges constata que a eternidade, assim como a conhecemos, foi inaugurada por Irineu, muito embora, outros escritos pareçam apontá-la, às vezes de forma tímida, outros de forma mais aproximada, como os de Platão, por exemplo. Afirma  o supracitado autor:

Pode-se afirmar, com suficiente margem de erro, que “nossa” eternidade foi decretada poucos depois da doença crônica intestinal que matou Marco Aurélio [...] essa eternidade coercitiva foi muito mais um simples paramento sacerdotal ou um luxo eclesiástico: foi uma resolução e foi uma arma: O verbo é engendrado pelo Pai, o espírito Santo e gerado pelo Pai e pelo Verbo, os gnósticos costumavam inferir duas inegáveis operações que o pai era anterior ao verbo, e os dois ao Espírito. Essa inferência dissolvia a Trindade. Irineu explicou que o duplo processo - geração do Filho pelo Pai, emissão do Espírito pelos dois - não aconteceu no tempo, mas que esgota de uma só vez o passado, o presente e o futuro [...] Assim foi promulgada a eternidade, antes apenas tolerada na sombra de algum desautorizado texto platônico[...]. Desde que Irineu inaugurou a  eternidade[1].

Apesar de encontrarmos registros na história do pensamento e principalmente da Teologia, a questão da eternidade, em linhas gerais, tem sido limitada  à apreensão de todas as frações de tempo; não sendo raro encontrarmos definições, em Dicionários Teológicos que simplesmente se contentam em repetir algumas frases isoladas, retiradas dos escritos hebraicos do Velho Testamento como: “um dia diante do Senhor é como mil anos”, “Eu sou o que Sou”, “Eu sou o Alfa e o Omega, o princípio e o fim” entre outras definições clássicas.
                  
As diversas abordagens da eternidade parecem nos dar a impressão que estamos falando não de uma, mais de várias eternidades, isto é, de vários sentidos em que pode ser aplicada ou examinada. Dentre essas variadas abordagens a elaborada por Agostinho de Hipona é digna de destaque, como bem sugere Borges:                   

Examinemos uma eternidade que é mais pobre que o mundo. Resta-nos ver como nossa igreja a adotou e lhes confiou um caudal superior a tudo o que os anos transportam. O melhor documento da primeira eternidade é o quinto livro das Enéades; o segundo, ou cristã, o décimo segundo livro das confissões de Santo Agostinho[2].

Agostinho foi conduzido a analisar a questão do tempo e, conseqüentemente, da eternidade, a partir de três controvérsias: a primeira contra os maniqueus, que ridicularizavam a criação de todas as coisas em “um determinado princípio”, pondo em dúvida também a própria eternidade de Deus, pois se houve um princípio que Deus resolveu “criar”, isto é, se houve mudança, em certo sentido, na atitude de Deus, como poderia ser ele eterno já que é propriedade da eternidade não mudar? :

Agostinho é levado a teorizar sobre o tempo por conta da controvérsia com os maniqueus. Sua teoria do tempo passa obrigatoriamente por esse prisma, pois é por conta dessa controvérsia que ele desenvolve seus argumentos sobre a temática[3].

A segunda controvérsia, ainda contra os maniqueus, tratou do problema do mal; controvérsia essa que, em certo sentido, é uma espécie de desdobramento do primeiro embate.

A terceira controvérsia que levou Agostinho a teorizar sobre o tema, desta feita, de forma mais especificamente em relação à eternidade, foi a controvérsia contra os pelagianos. Esta controvérsia, como veremos, passa necessariamente por questões sotereológicas já que a argumentação pelagiana apelava para uma escolha feita por Deus, para salvar alguns, baseada no seu atributo da presciência e, principalmente, na própria vontade livre do homem; que em certo sentido, transfere a responsabilidade de escolha no homem e não mais em Deus; diferentemente de Agostinho que rejeitava essa idéia e  afirmava que Deus, deste a eternidade, havia decretado escolher seus eleitos para a salvação de suas almas:

A eternidade permaneceu como atributo da ilimitada mente de Deus, e sabe-se muito bem que as gerações de teólogos tem trabalhado essa mente a sua criação e semelhança. Nenhum estímulo tão vivo quanto o debate da predestinação. Quatrocentos anos depois da paixão e morte de Cristo, o monge inglês Pelágio incorreu no "escândalo" de pensar que os inocentes que morrem sem o batismo alcançam a glória. Agostinho, bispo de Hipona, o refutou com indignação aclamada por seus editores. Observou a heresia dessa doutrina: a negação de que no homem  Adão todos nós homens já pecamos e perecemos, o esquecimento horrível de que essa morte se transmite de pai para filho pela geração carnal – adiante que segundo a justiça todos nós merecemos o fogo sem perdão, mas que Deus determina salvar alguns, segundo seu arbítrio[4].

Veremos, de forma sintetizada, acerca dessas três disputas pois cremos encontraremos as bases da eternidade agostiniana; posteriormente nos deteremos mais especificamente sobre a eternidade em relação a alma do homem, isto é, à continuidade da atividade da alma após a morte do corpo: a imortalidade da alma.




[1] BORGES, Jorge Luis. História da eternidade. Trad. Carmen Cirne Lima. 4.ed. São Paulo: Globo, 1991, p.22,23
[2] BORGES, 1991, p.21
[3] RUFINO, 2003, p.35
[4] BORGES, 1991, p.21

sábado, 15 de agosto de 2015

DONS DE LÍNGUAS, PROFECIAS E SONHOS: DONS ESPETACULARES QUE CESSARAM


O vídeo abaixo é de um ladrão (o mesmo da imagem acima) que supostamente fala em "línguas estranhas" e se auto-intitula "Zeus, Luz". Além disso, ele diz ter o "dom da interpretação". É evidente que não queremos dizer que ele é de alguma igreja pentecostal. Porém, certamente, ele teve contato com essa "doutrina" no meio pentecostal. Fica o registro para que comecemos a refletir sobre esse importante tema da cristandade de nossos dias, desde 1910.



Abaixo você poderá assistir a Palestra ministrada pelo Rev.Daniel Carneiro, na 1ª Igreja Presbiteriana do Jordão - Recife-PE, em 2015. O Rev.Daniel é professor de Teologia e Símbolos de Fé do Seminário Presbiteriano do Norte- SPN.

Parte 1/3


Parte 2/3


Parte 3/3



sexta-feira, 24 de julho de 2015

A MEDIAÇÃO DE CRISTO E A INTERCESSÃO DO ESPÍRITO SANTO EM NOSSOS ORAÇÕES


A mediação de Cristo nos permite entrar ousadamente na presença de Deus, em oração, à semelhança do que fazia o sacerdote, do VT. Porém, uma vez diante Dele, "não sabemos orar como convém". Por isso, necessitamos da intercessão do Espírito Santo, que filtra nossas petições transformando-as em petições aceitáveis, em sintonia com a vontade de Deus. A qualidade de nossas petições, antes dessa intercessão bendita, é tão ruim e tão distantes da vontade de Deus que se Ele nos atendesse seria, isso, nossa completa destruição. A qualidade de nossas orações, antes dessa intercessão, pode ser comparada a água captada de um rio poluidíssimo, absolutamente imprópria para o consumo, com grande potencial letal, enquanto que o trabalho intercessório do Espírito Santo poderia ser comparado ao processo de despoluição dessa água, como ocorre nas estações de tratamento de água, tornando-a límpida e apropriada para o consumo. Contudo, devido ao péssimo estado inicial de nossas petições, esse é um trabalho custoso, intenso, dramático. Por isso mesmo o Espírito Santo intercede por nós "com gemidos inexprimíveis". Portanto, nenhuma oração será considerada aceitável se o suplicante não contar com a mediação de Cristo e com a intercessão do Espírito Santo.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

8º MANDAMENTO: O MANDAMENTO QUE NOS OBRIGA A UMA VIDA DE HONESTIDADE


TEXTO BÁSICO: LUCAS 19:1-10

INTRODUÇÃO:
Conta-se que um sapateiro, ao se converter,  teria perguntado Lutero: “o que devo fazer agora”? Lutero teria respondido: “Faça o melhor sapato que puder e venda-o por um preço justo”.

Lutero estava ensinando àquele sapateiro que ele agora tinha “um nome a zelar”: o do Senhor Jesus Cristo. portanto, não podia ser apanhado em uma situação de desonestidade ou de tirar vantagem em cima das pessoas, para benefício próprio.

O próprio Lutero, que estava ensinando esse preceito bíblico da honestidade, tinha esse modelo de vida muito bem claro em sua  mente, em seu coração. Essa também era uma preocupação e uma realidade na vida de Calvino. Veja o que um ateu falou deles, do trabalho e da influência deles:

“O efeito da Reforma foi o de aumentar em si mesmo, se comparado à atitude católica, e aumentar de forma poderosamente a ênfase moral e a sanção religiosa em relação ao trabalho secular organizado no âmbito da vocação” (WEBER, 2002. p.128). 

“O Deus de Calvino exigia de seus crentes não boas ações isoladas, mas uma vida de boas ações combinadas em um sistema unificado” (WEBER, 2002. p.91).

Vida reta, honestidade. Não fraudar, não roubar, não querer tirar vantagem das outras pessoas em benefício próprio. Esse  preceitos eram perseguidos por Lutero, Calvino, pelos puritanos e tantos outros servos de Deus.

“Coube aos puritanos, que se consideravam eleitos, viver a santificação da vida cotidiana. Pois o caráter sectário – a consciência de ser minoria e a motivação de ser eleito de Deus – fazia de cada membro dessas comunidades não mero adepto do rebanho mas, mas um vocacionado que se dedicava simultaneamente ao aprimoramento ético, intelectual e profissional” (WEBER, 2002. p.21).

Mas esse é um tema que tem sido esquecido pelos crentes hoje em dia. Há quem diga “que não faz negócio com crente”. A bancada evangélica é uma vergonha. Os caras desviam dinheiro, roubam e ainda oram ao senhor agradecendo pelo dinheiro sujo, como foi noticiado há uns dois anos atrás.

Aí você diz “é um absurdo mesmo”.

E as filas que fura? E a balança enganosa? E os desvios de conduta? E as declarações falsas e ou mentirosas que você pede pra alguém fazer para beneficiá-lo, de alguma forma? E a compra do ingresso do cinema usando a carteira de estudante de outra pessoa, para pagar mais barato? E o suborno que, crente, dá ao policial igualmente corrupto para livrar-se de uma multa? E os macacos que você, crente, tem em sua energia, para pagar menos? E o jacaré, na água?


ELUCIDAÇÃO:

O texto que lemos, também trata desse mesmo assunto; acerca da honestidade que os servos de Deus precisam nutrir em suas vidas, a fim de glorificarem ao nome do Senhor.

Em sua passagem por Jericó Jesus viu um homem em cima de uma árvore e resolveu que iria ficar hospedado em sua casa (v.5)
Essa simples atitude de Jesus gerou certa insatisfação entre os que presenciaram o fato. O texto de diz que “todos murmuraram” (v.7).

Esse homem era Zaqueu. Um dos personagens bíblicos mais conhecidos, por conta daquela música que nunca mais sairá da nossa cabeça. Ele era um Publicano. Mas não um simples Publicano; ele era o “maioral dos Publicanos”, isto é, ele era o “chefe dos agentes de cobrança locais”.  

Isso explica o motivo da “murmuração de todos”

Só pra entendermos bem essa questão:

a) Os Publicanos eram judeus a serviço do império Romano. Em vários textos da Bíblia essas pessoas eram comparadas aos piores tipos de gente: “Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo?” (Mateus 5.46). Observe como os publicanos são vistos com negatividade.

b) As pessoas viam os publicanos  uma espécie de traidores, pois trabalhavam para o império Romano, que as dominava com violência.

c) Eles cobravam  impostos abusivos, trazendo muitas dificuldades aos Judeus. Isso revoltava o povo trabalhador.

d) Por fim,  a maioria dos publicanos eram corruptos, cobrando além do que era taxado pelo império. Com isso, muitos publicanos enriqueciam explorando seu próprio povo e atraindo o ódio deles para si.


Mas o v.9 nos dá uma informação importante: Zaqueu é convertido a Deus; a graça eficaz de Deus o alcançou.

Tocado pelo Espírito Santo, Zaqueu logo identificou que NÃO PODIA CONTINUAR FAZENDO O QUE SEMPRE FEZ EM SUA VIDA. Ele entendeu que suas PRÁTICAS desonestas eram absolutamente INCOMATÍVEIS com sua nova vida. Ele resolve então, constrangido pela LEI MORAL de Deus, gravada no seu coração e no coração de todos os homens, por isso todos sabem quando SÃO DESONESTOS; QUANDO BURLAM; QUANDO FRAUDAM; QUANDO ROUBAM, que estão fazendo algo errado, RESOLVE mudar completamente suas práticas. Vejamos:

Ler V.8

Zaqueu resolveu não mais DESOBEDECER aos princípios estabelecidos na palavra de Deus; em sua LEI MORAL, especificamente no 8º mandamento, que é “NÃO FURTARÁS”.

Quero pensar sobre esses princípios, juntamente com todos. Quero falar sobre:

TEMA: Os princípios da LEI MORAL, do 8º MANDAMENTO, que nos obrigam a viver uma vida de HONESTIDADE.

O CATECISMO MAIOR DE WESTMINSTER, na pergunta  99, trata sobre algumas regras que devem ser entendidas para a boa compreensão da LEI MORAL de Deus. A 4ª regra ensina o seguinte:

Que onde um dever é prescrito, o pecado contrário é proibido; e onde um pecado é proibido, o dever contrário é prescrito”.

Dentro dessa perspectiva analisaremos, seguindo a orientação dessa boa regra de compreensão da LEI MORAL de Deus:

1ª) Os DEVERES EXIGIDOS NO 8º MANDAMENTO:

141. Quais são os deveres exigidos no oitavo mandamento? 
Os deveres exigidos no oitavo mandamento são: a verdade, a fidelidade e a justiça nos contratos e no comércio entre os homens, dando a cada um o que lhe é devido, a restituição de bens ilicitamente tirados de seus legítimos donos; a doação e a concessão de empréstimo, livremente, conforme as nossas forças e as necessidades de outrem; a moderação de nossos juízos, vontades e afetos, em relação às riquezas deste mundo; o cuidado e empenho providentes em adquirir, guardar, usar e distribuir aquelas coisas que são necessárias e convenientes para o sustento de nossa natureza, e que condizem com a nossa condição; o meio lícito de vida e a diligência no mesmo; a frugalidade; o impedimento de demandas forenses desnecessárias e fianças, ou outros compromissos semelhantes; e o esforço por todos os modos justos e lícitos para adquirir, preservar e adiantar a riqueza e o estado exterior, tanto de outros como o nosso próprio. 
Êx23:4,5;Lv6:4,5;25:25;Dt15:7,8,10;22:1-4;Sl 15:2,4; Pv 6:1-5;10:4;11:15;12:27;21:20;27:23,24; Mq 6:8; Zc 8:16; Lc 6:30,38; Jo 6:12; Rm 12:5-8,11;13:7; I Co 6:7; Gl 6:10; Ef 4:28; Fp 2:4; I Tm 5:8;6:8,9,17,18.

2º) OS PECADOS PROIBIDOS NO 8º MANDAMENTO

142. Quais são os pecados proibidos no oitavo mandamento? 
Os pecados proibidos no oitavo mandamento, além da negligência dos deveres exigidos, são: o furto, o roubo, o tráfico de seres humanos e a recepção de qualquer coisa furtada; as transações fraudulentas e os pesos e medidas falsos; a remoção de marcos de propriedade, a injustiça e a infidelidade em contratos entre os homens ou em questões de confiabilidade; a opressão, a extorsão, a usura, o suborno, as vexatórias demandas forenses, o cerco injusto de propriedades e a desapropriação; a acumulação de gêneros para encarecer o preço; os meios ilícitos de vida, e todos os outros modos injustos e pecaminosos de tirar ou de reter de nosso próximo aquilo que lhe pertence, ou de nos enriquecer a nós mesmos; a cobiça, a estima e o amor desordenado aos bens mundanos, a desconfiança, a preocupação excessiva e o empenho em obtê-los, guardá-los e usar deles; a inveja diante da prosperidade de outrem; assim como a ociosidade, a prodigalidade, o jogo dissipador e todos os outros modos pelos quais indevidamente prejudicamos o nosso próprio estado exterior; e o ato de defraudar a nós mesmos do devido uso e conforto da posição em que Deus nos colocou. Êx21:16;Lv25:17;Dt12:7;16:14;19:14;Is5:8;33:15;Sl37:21;50:18;62:10;73:3;Pv1:19;3:30;11:1,26;18:9;20:10;21:6,17;23:5,20,21;29:19;29:24;Ez2:12,29;Am 8:5;Mq 2:2;Mt 6:25,34;23:25;Lc 12:15;16:11,12;At 19:19;I Co 6:7;I Jo 2:15,16;3:17; Tg 2:15,16;5:4,9; Ef 4:28; I Tm 1:10;I Ts 4:6; II Ts 3:11.

CONCLUSÃO:


Devemos ter a mesma atitude positiva que teve Zaqueu de modificar sua vida; de parar de roubar; parar de ser desonesto. Uma vida que contemple as exigências e as proibições do oitavo mandamento.  

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